No dia 23 de dezembro, às vésperas do Natal, o pesquisador do Museu Emilio Goeldi, em Belém (PA), Alberto Akama, visitava pescadores na praia de Copacabana, no Rio de Janeiro, apenas por curiosidade, para observar os peixes capturados nas redes.
Nesse dia, uma surpresa: um tubarão-martelo havia ficado enroscado em uma rede de pesca e já estava sem vida quando foi encontrado. Ciente do valor do achado, Akama prontamente entrou em contato com o Museu Nacional do Rio de Janeiro, onde o tubarão passará a fazer parte do acervo em exposição.
Visitar os pescadores da Colônia Z-13, na praia de Copacabana, para observar os peixes é rotina para Akama. Dessa vez, ele saiu com os pescadores César, Edson e Moisés. O tubarão-martelo estava na rede, próximo às Ilhas Cagarras, na altura de Ipanema. “Foi uma captura acidental”, conta Akama. “O tubarão se enroscou na rede e acabou morrendo”.
Foram necessárias três pessoas para carregar o animal, que pesa mais de 100 quilogramas (kg) e tem 2,5 metros. “Não é uma coisa rara encontrar tubarões, mas esse foi o maior que foi pescado no ano, com certeza”, diz. Akama logo pensou que seria interessante para o Museu Nacional do Rio de Janeiro contar com um exemplar de tubarão-martelo encontrado no mar carioca.
O animal representa também, de acordo com o pesquisador, a recuperação do meio ambiente. O local onde foi encontrado é próximo à Unidade de Conservação Monumento Natural das Ilhas Cagarras, criada pela Lei 12.229 em 2010. A unidade está localizada a aproximadamente 5 quilômetros da praia de Ipanema e é parte do cartão postal do Rio.
“[O local] estava bem deteriorado. A partir do momento que se torna monumento, foram retiradas toneladas de entulho, sujeira e lixo que as pessoas tinham deixado. Agora, as condições do monumento são diferentes”, explica, Akama. “[O tubarão] tem esse significado muito importante de que a vida marinha volta se voltarmos a cuidar”.
Riscos a banhistas
No mesmo dia em que foi encontrado, o tubarão-martelo da espécie Sphyrna lewini foi encaminhado ao museu. Akama entrou em contato com o amigo e colega de profissão Marcelo Britto, que é professor no Museu Nacional e especialista em peixes.
Britto, explica que o tubarão é também um registro histórico. “Ele é testemunho da ocorrência dessa espécie nas águas litorâneas do Rio de Janeiro. A preservação vai permitir que diversas gerações possam verificar isso”, diz.
Segundo o professor, não é comum encontrar tubarões-martelo no litoral carioca, ainda mais desse porte. Uma das hipóteses, de acordo com Britto, é que ele tenha sido atraído por algum cardume de peixes que caçava. Como se trata de um animal que precisa se mover com frequência, ter se enroscado na rede pode ter feito com que não tivesse oxigenação suficiente.
Britto conta ainda que a espécie não oferece risco aos banhistas uma vez que, apesar de serem avistadas da costa, as Ilhas Cagarras estão distantes da praia. Além disso, comparadas a outras espécies de tubarão, são raros os acidentes e ataques envolvendo tubarões-martelo.
A conservação deste exemplar em formol será possível porque, no ano passado, o museu adquiriu um tanque especial para armazenar o corpo de Margarida, tubarão fêmea da espécie mangona.
Margarida foi o primeiro grande tubarão a viver no AquaRio, aquário público situado no bairro da Gamboa, na Zona Central da cidade. Agora, segundo Britto, os dois tubarões dividirão o tanque.
Recomposição do acervo
Segundo o diretor do museu Alexandre Kellner, o tubarão chega ao museu por conta de uma conjunção de fatores: a pessoa certa, no lugar certo, e no momento em que a instituição está em campanha para a recomposição de seu acervo. Caso isso não tivesse ocorrido, “possivelmente, o tubarão teria sido descartado”, diz Kellner.
Vinculado à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o Museu Nacional localiza-se na Quinta da Boa Vista e é a mais antiga instituição científica do Brasil. Foi fundado por D.João VI em 1818.
Em 2018, um incêndio de grandes proporções arrasou exemplares raros, como esqueletos de animais pré-históricos, artefatos etnográficos e múmias.
Em uma área total de 21 mil metros quadrados (m²), sendo 11.417 m² de área construída, o Paço de São Cristóvão abrigava aproximadamente 5 mil itens nas salas de exposição e 3,5 milhões de itens no acervo da seção de Memória e Arquivo. De acordo com Kellner, o museu perdeu, no incêndio, 85% do acervo.
O diretor da instituição ressalta que o museu segue em intensa campanha para a recomposição do acervo. Mais informações sobre doações e outras ações podem ser obtidas no portal #Recompõe.