Alemanha faz estudo com renda básica incondicional de 1.200 euros mensais ou R$ 7556,62 reais por três anos

O que você faria se tivesse renda assegurada por três anos? Ficaria à toa? Investiria no futuro? Na Alemanha, 122 participantes de um projeto-piloto receberão 1.200 euros por mês, livres de qualquer compromisso.

A partir desta terça-feira (01/06) 122 cidadãs e cidadãos da Alemanha passarão a receber 1.200 euros por mês, durante três anos, sem quaisquer condições impostas. Eles foram escolhidos, entre mais de 2 milhões de candidaturas, para participar de um projeto-piloto sobre os efeitos pessoais de uma renda básica incondicional (Bedingungsloses Grundeinkommen – BGE).

Os participantes não tiveram que comprovar qualquer tipo de carência, e durante o período do experimento, que será cientificamente monitorado, podem trabalhar – ou não – o quanto quiserem, não tendo qualquer tipo de obrigação perante os patrocinadores, “a não ser, durante os três anos do estudo, preencher sete formulários online”, consta do site do projeto.

Outros 1.380 indivíduos responderão as mesmas perguntas a cada seis meses, mas apenas em troca de um pequeno ressarcimento pela participação. A escolha foi ao acaso.

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A renda básica é livre de tributação, equivalendo a um presente financeiro de 43.200 euros por cabeça, totalizando 5,2 milhões de euros, provenientes de 150 mil doadores. A iniciativa é da associação sem fins lucrativos Mein Grundeinkommen, sediada em Berlim.

Fantasia esquerdista ou solução para o futuro?

Seus iniciadores partem da convicção de que uma renda básica universal resolveria muitos problemas do dia a dia: se cada indivíduo estiver livre da pressão de ganhar dinheiro para se sustentar, todos serão mais livres, mais criativos e, no geral, mais felizes – essa é a hipótese a ser verificada.

O projeto quer verificar se essa utopia se sustenta na realidade. “Nós testamos o que as pessoas fazem quando têm segurança material por três anos”, explica o coordenador do estudo, Jürgen Schupp, do instituto de estudos econômicos DIW. “Elas gastam o dinheiro ou formam reservas financeiras? Param de trabalhar ou trabalham menos? Tornam-se mais socialmente conscientes e doam mais?”

Tudo isso poderá ser comprovado no atual experimento em grande escala, assegura Schupp. Será possível até medir mudanças no nível de estresse, a partir de amostras de cabelo de alguns voluntários – pois talvez a renda básica incondicional os faça sentirem-se menos pressionados.

No campo ideológico, o debate sobre o BGE vem sendo travado há anos. O cerne da questão é: o que fazem os seres humanos se não são forçados a nada? Muitos adversários da ideia a consideram uma fantasia de esquerdistas deslumbrados, que querem ficar à toa à custa da sociedade.

Seus defensores, em contrapartida, a veem como a solução de problemas atuais e futuros: os aspectos sociais – da educação até os cuidados, passando pela ajuda entre vizinhos – seriam valorizados, desenvolvendo-se modelos pioneiros para um futuro em que postos de trabalho clássicos se tornariam raros, devido à digitalização crescente.

Michael Bohmeyer é fundador da associação GrundeinkommenFoto: picture-alliance/dpa/W. Kumm

Segurança material dá coragem?

Schupp também espera obter dados sobre temas especialmente centrais para os opositores de uma renda básica: força inovadora e empreendedorismo. “Talvez os receptores de uma renda básica se tornem, afinal, mais corajosos em suas decisões, por exemplo, para se tornarem autônomos ou se reorientarem profissionalmente.”

Pelo menos chama a atenção o fato de que empresários importantes – como Bill Gates, Marc Zuckerberg e Jeff Bezos, ou os irmãos alemães Marc e Oliver Samwer (ativos na criação de empresas de tecnologia) – não exatamente temiam pela sua sobrevivência quando fundaram suas firmas.

O lema do projeto é “Queremos saber”. E Michael Bohmeyer, fundador da associação Mein Grundeinkommen, confessa que a perspectiva de obter dados concretos o deixa nervoso: “É claro que desse projeto-piloto também pode resultar que a renda básica não tem nada do efeito que pensamos”, diz num vídeo no site do estudo.

Seja como for, é questionável que dentro de três anos, após a conclusão do estudo, a polêmica sobre a renda básica universal vá ganhar um caráter menos ideológico. Desde já, alguns críticos discutem até mesmo a abordagem: um argumento é que a limitação em três anos não permite extrapolar conclusões sobre o comportamento se a renda básica fosse vitalícia.

Falta apoio político

Acrescentem-se isso todas as grandes questões que o projeto não será capaz de responder: como os preços evoluirão se houver uma renda básica universal? Os indivíduos realmente doentes ou carentes acabariam por dispor de menos dinheiro do que atualmente? E quão altos devem ser os impostos para financiar tudo isso?

“Nosso estudo certamente não vai responder todas as perguntas em torno da renda básica”, admite Schupp. Mas ele se diz satisfeito se obtiver respostas a sua pergunta central: “O que o dinheiro faz com as pessoas? Essa é uma questão científica fascinante, sobre a qual até agora não há estudos conclusivos, em todo o mundo.”

Já houve outras tentativas de saber mais sobre os efeitos de uma renda básica. Mas os resultados de um experimento na Finlândia, concentrado no mercado de trabalho, foram ambivalentes. Uma análise em grande escala no Canadá, financiada com verbas públicas, foi encerrada depois de pouco tempo devido aos custos.

Também na Alemanha falta apoio político para uma renda básica universal: até agora, nenhum dos grandes partidos políticos se empenhou pela causa. Após a conclusão da atual fase de experimento trianual, em outros dois estudos o projeto Mein Grundeinkommen quer se dedicar aos fundamentos do financiamento.