Em conversa com participantes nesta segunda-feira (17), dia de estreia do reality show, modelo e designer de unhas disse que negros foram escravizados por serem ‘fortes e eficientes’.
O “BBB22” estreou nesta segunda-feira (17) e, claro, teve um longo bate-papo entre os confinados. Durante a conversa um dos comentários de Natália repercutiu nas redes sociais.
A modelo e designer de unhas de 22 anos afirmou:
“Sou preta. Realmente tem a história que a gente veio e viemos como escravos, sim. Por quê? Porque a gente era eficiente. Por quê? Porque a gente era forte. Por que é que a gente veio como escravo? Porque a gente era bom no que a gente fazia. Por isso, porque talvez se colocasse uma pessoa lá pra fazer aquilo, talvez não conseguiria.”
O comentário gerou debates nas redes. Para Antônio Carlos Jucá, professor de História do Brasil da UFRJ, esse tipo de conversa é importante.
“Estamos numa época de muito negacionismo. De que ‘a escravidão não foi tudo isso, o tráfico de escravos não foi tudo isso’. E quando na realidade foi, sim, tudo isso. Foi violenta, grave, não pode ser suavizada. É sempre bom toda discussão que se levanta para negar o negacionismo”, diz o professor ao g1.
‘Naturalização da escravidão’
Jucá comentou falas como as de Natália: “A minha impressão pela fala é que ela quis dar um sinal positivo para a participação negra, para os negros. Mas acho que o problema dessa fala é que leva a uma naturalização da escravidão.”
Ele ressaltou que há um equívoco em discursos como esse. “Os africanos foram escravizados [no Brasil], mas tem que lembrar que primeiro foram os indígenas. E os negros foram trazidos porque já existia a escravidão africana. E a partir do século XV, antes da descoberta do Brasil, já se fazia o tráfico de escravos na África. Esse tráfico já existia e essa é a razão fundamental pela qual os africanos são trazidos para cá.”
“E é importante chamar atenção na fala dela, que achei complicada porque tem um discurso racista mais antigo ainda. Por um lado, valorizava-se o negro, e desvalorizava mais ainda o índio. Dizia-se que o africano não era muito inteligente, mas muito bom de trabalho. E o indígena era preguiçoso. Então tinha um racismo duplo. É importante tomar cuidado com isso.”
‘Processo de alienação’
O apresentador e comunicador Roger Cipó comentou a fala de Natália. Na conversa com o g1, ele ampliou o debate: “Analisando a fala da Natália, além de ser extremamente problemática, é um desserviço, não só para a comunidade negra, mas pra sociedade brasileira.”
“Mas não é de uma responsabilidade total de Natália, que é uma jovem de 22 anos e que visivelmente não teve acesso à educação e à informação. Porque todas as pessoas nesse país foram submersas a um processo de deseducação, um processo de alienação a história da escravização dos povos africanos no Brasil. A gente precisa falar sobre isso”, afirmou Roger.
“De repente esse episódio lança luz ao que os intelectuais negros têm falado no Brasil desde sempre, falando inclusive de como é importante que a gente preserve e faça valer, faça acontecer, a lei 10.639, que obriga o ensino da cultura da história negra nas escolas públicas e privadas.”
“Esse ensino é importante para que se reconheça de fato a história dos povos africanos que são responsáveis pela formação do Brasil. E reconhecer isso também é dizer que o processo de escravização é reconhecido como um dos maiores crimes contra a humanidade. Tão tenebroso, tão danoso para a sociedade como foi Auschwitz.”
No Twitter, o advogado Thiago Amparo comentou a fala dita no BBB. “Não é pela eficiência. É por escravos terem sido considerados menos do que humanos e por escravos terem sido o pilar de um sistema econômico baseado em sua mão de obra explorada.”
Na rede social, a também advogada Fayda Belo tuitou sobre o tema: “Não era porque éramos fortes, é porque para eles éramos inferiores. A escravidão foi um crime brutal que nos roubou a vida, a dignidade e que até hoje nos tira oportunidades. Não romantize a escravidão.”
Fonte: G1