Empresas de apostas esportivas oferecem prêmios para quem acertar vencedores das eleições municipais em capitais como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte; procuradas pelo Estadão, as cinco bets envolvidas não se manifestaram.
Cinco empresas de apostas esportivas estão explorando as eleições municipais como tema de apostas, permitindo que usuários apostem nos resultados em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte. Apesar da falta de regulamentação específica, o Ministério da Fazenda alertou para a ilegalidade desses jogos. Especialistas em direito eleitoral veem brechas na legislação que permitem a prática, enquanto o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não se manifestou sobre o tema.
Apostas sobre eleições desafiam regulação
Cinco casas de apostas, incluindo Bet365, Superbet, SportingBet, Betano e Betspeed, abriram mercados voltados às eleições municipais deste ano. Essas bets estão permitindo que os usuários apostem nos possíveis vencedores das prefeituras em capitais como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte. Na Betano, por exemplo, é possível apostar em candidatos de até oito capitais. Já na Bet365, os mercados foram criados para cinco cidades, e nas demais empresas, as apostas se concentram na disputa pela Prefeitura de São Paulo.
Procuradas pela reportagem do Estadão, as cinco empresas de apostas mencionadas não responderam. Enquanto isso, o Ministério da Fazenda, responsável por regular o setor de apostas esportivas no Brasil, declarou que não há base legal para jogos relacionados às eleições. A legislação atual prevê apostas somente em eventos esportivos e jogos on-line, deixando de fora cenários políticos.
Brechas na legislação eleitoral e a visão de especialistas
Apesar de não existir uma proibição explícita, especialistas afirmam que as apostas sobre eleições podem ser interpretadas como propaganda eleitoral irregular, dependendo de como são divulgadas. Segundo Fernando Neisser, advogado especialista em Direito Eleitoral, há um vácuo na legislação que permite a existência desses mercados de apostas, desde que as odds não sejam confundidas com pesquisas eleitorais. “Tudo que não é proibido, em tese, é permitido”, comentou Neisser.
Alberto Rollo, outro especialista em Direito Eleitoral, levantou uma preocupação adicional. Segundo ele, embora a prática não influencie diretamente os apostadores, pode ter impacto sobre os eleitores em geral, ao criar uma percepção distorcida dos candidatos favoritos. “A Justiça Eleitoral terá que se preocupar com isso, pois é uma questão nova no Brasil”, afirmou Rollo.
Odds: como funcionam as apostas eleitorais
As odds, que indicam as probabilidades de um determinado candidato vencer, determinam o valor que será pago em caso de vitória. Por exemplo, na noite de quarta-feira, 11, a Betano oferecia uma odd de 1.83 para o atual prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), 2.20 para o ex-coach Pablo Marçal (PRTB) e 5.00 para o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL). Com uma aposta de R$ 100, o apostador poderia receber R$ 183, R$ 220 ou R$ 500, respectivamente, dependendo do resultado das eleições.
As apostas em cenários políticos não são exclusividade do Brasil. Em outros países, como o Reino Unido, os mercados eleitorais são mais amplos, incluindo não só apostas sobre o vencedor, mas também sobre qual candidato será nomeado por um partido e até mesmo sobre a data de futuras eleições.
Ministério da Fazenda reforça ilegalidade das apostas políticas
Em dezembro de 2023, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a Lei das Apostas Esportivas, que regula as apostas no Brasil. De acordo com essa lei, as empresas estão autorizadas a criar jogos apenas com base em eventos esportivos ou em competições on-line. Qualquer aposta que vá além dessas modalidades, como é o caso das eleições, é considerada ilegal, de acordo com o Ministério da Fazenda.
A Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA), criada pela Fazenda para regulamentar o setor, estabeleceu que as empresas terão até 31 de dezembro de 2024 para se adequarem à nova regulamentação. No entanto, até essa data, as apostas relacionadas às eleições continuam sem respaldo legal e, portanto, ilegais.
Associação Nacional de Jogos e Loterias contesta proibição
A Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL), que representa as empresas de apostas no Brasil, declarou que a legislação atual não proíbe expressamente apostas sobre eleições. Segundo a ANJL, como os resultados eleitorais são eventos reais, as apostas nesse tipo de cenário ainda podem ser oferecidas até que a nova regulamentação entre em vigor em janeiro de 2025. Até lá, as empresas estão operando em uma “zona cinzenta” legal.
Apesar das advertências do Ministério da Fazenda, a ANJL argumenta que as casas de apostas devem ter liberdade para operar até que a regulação entre em vigor. “Considerando que os resultados eleitorais são eventos reais de temática não esportiva, entendemos que esse tipo de serviço não estará contemplado pela autorização federal a ser concedida às casas de apostas. Mas, até lá, não há ilegalidade nas apostas eleitorais”, afirmou a associação.