‘A gravidade do quadro descrito é inconteste e não poderia deixar de ser objeto de investigação imediata, aprofundada e elucidativa’, decidiu a ministra
BRASÍLIA – A ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia autorizou abertura de inquérito para apurar suspeitas contra o ministro da Educação Milton Ribeiro, envolvendo a atuação de dois pastores na liberação de recursos do ministério para prefeituras de aliados. A solicitação havia sido feita pelo procurador-geral da República Augusto Aras na quarta-feira.
“A gravidade do quadro descrito é inconteste e não poderia deixar de ser objeto de investigação imediata, aprofundada e elucidativa sobre os fatos e suas consequências, incluídas as penais”, diz trecho da decisão.
Ainda segunda a ministra a investigação é indispensável: “Nos autos se dá notícia de fatos gravíssimos e agressivos à cidadania e à integridade das instituições republicanas que parecem configurar práticas delituosas.”
Em outro trecho da decisão, Cármen Lúcia diz que “o cenário exposto de fatos contrários ao direito, à moralidade pública e à seriedade republicana impõe a presente investigação penal como atendimento de incontornável dever jurídico do Estado e constitui resposta obrigatória do Estado à sociedade, que espera o esclarecimento e as providências jurídicas do que se contém na notícia do crime”.
“Defiro o pedido da Procuradoria-Geral da República e determino a instauração de inquérito em desfavor de Milton Ribeiro, Ministro de Estado da Educação, para apurar os fatos descritos, que indicam possível prática de crimes”, escreveu. A ministra ainda autorizou a tomada dos depoimentos do ministro, dos pastores Arilton Moura e Gilmar Santos e dos prefeitos que relataram pedidos de propina em troca da liberação de recursos do ministério.
Ao autorizar abertura da investigação, Cármen Lúcia determinou o envio dos autos para a Polícia Federal e fixou o prazo de 30 dias para realização das diligências. O prazo poderá ser prorrogado se houver “motivação específica e suficiente”. Por ora, a ministra negou o pedido feito pela PGR para a polícia analisar as “circunstâncias da produção do áudio veiculado pelos portais de imprensa com pretensas declarações de Milton Ribeiro”.
Além do processo da PGR, há outras quatro ações no STF em que parlamentares de oposição pedem a investigação de Milton Ribeiro. Algumas delas também são direcionadas ao presidente Jair Bolsonaro, que não foi alvo do pedido da PGR. Cármen Lúcia é a relatora de todos os casos e disse que vai analisá-las no momento oportuno “em razão da indicação de circunstâncias peculiares e indicação de outros agentes públicos além do agora investigado”.
O pedido foi enviado nesta quarta-feira ao STF e cita como alvos investigados o ministro Milton Ribeiro e os pastores Arilton Moura e Gilmar Silva dos Santos, suspeitos de intermediarem reuniões de prefeitos no Ministério da Educação (MEC). O documento aponta a possível ocorrência dos crimes de corrupção passiva, tráfico de influência e advocacia administrativa.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) apontou que a posição ocupada por Milton Ribeiro lhe dá a possibilidade de direcionar a alocação de recursos do Fundo de Desenvolvimento Nacional da Educação (FNDE) em determinado município, o que permitiria o favorecimento a aliados. O pedido de investigação cita “a existência de uma uma potencial contrapartida à prioridade concedida na liberação dessas verbas” em troca da construção de igrejas nos municípios, o que poderia caracterizar os potenciais crimes.
“O conteúdo das representações dirigidas à Procuradoria-Geral da República portam grau de plausibilidade e lastro probatório material que reclamam apuratório para elucidação da possibilidade do cometimento dos delitos”, escreveu Aras. O procurador-geral citou ainda que o ministro não negou as reportagens veiculadas na imprensa a respeito do caso e admitiu os encontros com os pastores.
Dentre as diligências previstas, Aras quer tomar o depoimento de prefeitos sobre suposto pedido de propina feito por um dos pastores, Arilton Moura, em troca de interceder na liberação de recursos pelo MEC, os depoimentos do ministro e dos pastores.
O ministro da Educação, Milton Ribeiro, disse em uma gravação que prioriza a liberação de verbas prefeituras cujos pedidos foram negociados por dois pastores, segundo reportagem publicada pelo jornal “Folha de S.Paulo”. No áudio, o ministro afirmou que atendeu a uma solicitação do presidente Jair Bolsonaro. Sem cargos públicos, os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura atuam como assessores informais do Ministério da Educação, intermediando reuniões com gestores municipais, conforme revelou o jornal “O Estado de S. Paulo”.
Autor: O Globo Aguirre Talento, Mariana Muniz e André de Souza