Carnaval seguro no Rio exige cobertura vacinal de 80%, diz relatório

Os pesquisadores Hermano Castro, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), e Roberto Medronho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), enviaram proposta ao presidente da Comissão Especial de Carnaval da Câmara de Vereadores do Rio, Tarcísio Motta, de indicadores para a realização de um carnaval seguro em 2022. O relatório foi encaminhado também à Comissão Científica do município.

De acordo com Motta, o mais importante é a questão da vacinação e que a cobertura vacinal alcance números significativos, não apenas na capital fluminense. “Como o carnaval é um evento que recebe muitos turistas na cidade, é preciso que a gente fique com 80% da vacinação também no estado e no país”, disse ele. O índice se refere às duas doses completas ou à dose única.

Em entrevista à Agência Brasil, o pesquisador Hermano Castro, da Fiocruz, explicou que há necessidade de estabelecer o mesmo percentual para a cidade, o estado e o país, porque o Rio de Janeiro é o centro do carnaval no Brasil e recebe muita gente de outras localidades. “O ideal é que você tenha atingido a imunidade coletiva de 80%”, afirmou.

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Essa imunidade é baseada em um cálculo que se faz em epidemiologia, que tem a ver com a taxa de contaminação, a taxa de transmissão da variante Delta, que está de 5 a 9,5. Ou seja, uma pessoa pode passar a covid-19 para outras cinco e até nove. Antes passava para três. “É baseado nisso”. Castro avaliou que, com o avanço da vacinação, é possível que até o carnaval, se alcance os 80%. “O próprio município do Rio vai atingir esse patamar”.

Média móvel

No relatório, os pesquisadores definiram outros indicadores para a capital do estado. Um deles é a média móvel de atendimentos na rede municipal de saúde. “O indicador de atendimento na rede de urgência e emergência por dia no município pode ser utilizado por meio do atendimento diário e de sua média móvel de sete dias, computando casos de síndrome gripal e síndrome respiratória aguda grave”, diz o relatório.

A proposta que está sendo submetida ao comitê de especialistas da capital fluminense envolve uma média móvel semanal menor que 110 casos, ou o mesmo que 1,63 caso por 100 mil habitantes, com o menor tempo e a menor quantidade de pessoas para garantir o acesso às enfermarias e às unidades de UTI. O indicativo é não haver fila. “A gente colocou um número de três pessoas, no máximo, esperando uma hora. O ideal é que seja zero, como está atualmente. A fila está zero. Não tem ninguém esperando. Significa que há poucos casos sendo atendidos na rede municipal”.

Outro indicador é a taxa de testes positivos. De cada 100 testes que são coletados e levados para laboratório, a taxa de positividade está menor que 5%. “Na semana passada era 4%. Significa que de cada 100 amostras coletadas na população para diagnosticar covid-19, só quatro vinham positivas. É uma taxa boa”, disse Hermano Castro.

A taxa de contágio da cidade, definida como R, que determina o potencial de propagação do vírus, deve estar abaixo de 1 e, preferencialmente, em torno de 0,5, quando cada vez menos indivíduos se infectam e o número de contágios retrocede. Esse número deve ser sustentado por um período mínimo de sete dias. Segundo Castro, esses indicadores não são difíceis de atingir. “Eu acho que é um esforço governamental importante avançar com as vacinas”.

O presidente da Comissão Especial de Carnaval da Câmara, Tarcísio Motta, defendeu que esses são os elementos que devem ser observados para que se tenha um carnaval seguro. “É bastante provável que isso aconteça. Nós estamos com todos esses indicadores melhorando. Se nada de muito ruim acontecer no caminho, podemos ter um carnaval alegre e seguro”. Ele espera que o Comitê Científico avance em suas análises para que, até o dia 2 de dezembro, o relatório final da comissão possa apresentar suas recomendações à prefeitura do Rio. “A questão é acompanhar, fiscalizar e fazer o monitoramento desses índices”.

Motta reforçou que se nada de anormal acontecer de agora até fevereiro de 2022, o carnaval poderá ser realizado. “A nossa questão é essa: só poderemos ter carnaval se ele não for um risco para a vida. Ele não será um risco para a vida se esses indicadores estiverem monitorados. Se for necessário distanciamento e máscara, não haverá carnaval”.

Orientações

Os pesquisadores sugeriram também orientações protocolares. Para a rede hoteleira, por exemplo, a recomendação é que antes e durante o carnaval, os hotéis cobrem dos hóspedes o passaporte vacinal. “Só pode hospedar no hotel, no hostel (albergue) ou no airbnb (hospedagem em residências privadas) se tiver com a carteira de vacina do local de procedência, seja de outro país, outro estado ou outro município fluminense. Isso deve ser uma exigência preliminar, para que o hotel possa só admitir hospedagem se tiver com a carteira de vacinação em dia”.

Hermano Castro lembrou que o relatório busca, realmente, um carnaval seguro. “Nessa festa, é difícil a gente propor uso de máscara, a não ser a máscara de carnaval, e distanciamento social. São coisas difíceis”. Ele considera que para haver carnaval e aglomeração, com pessoas próximas das outras, sem a máscara, é necessário ter padrões e indicadores bem rígidos para que o ambiente seja o mais seguro possível.

O presidente da Comissão de Carnaval da Câmara, Tarcísio Motta, sugeriu que, em ambientes fechados, possa haver a cobrança do passaporte vacinal. À prefeitura, disse que poderiam ser montados estandes de testagem para os foliões, com a realização de estudos sobre como o vírus vai se comportar ao longo do carnaval, para fins de controle.

Audiência pública

O relatório foi uma resposta dos pesquisadores da Fiocruz e da UFRJ à audiência pública da qual participaram, promovida pelos carnavalescos do Rio e pelas autoridades públicas cariocas, visando ao encaminhamento de sugestões para o comitê científico do município.

Hermano Castro lembrou que antes do carnaval, o Rio de Janeiro terá a experiência do réveillon. Por isso, acredita que os membros do comitê já estariam estudando os indicadores e orientações propostos no relatório. “Também o réveillon recebe milhares de pessoas de todo o mundo”, destacou.

A cobertura vacinal na cidade do Rio está em quase 60% atualmente. Hermano Castro acredita que já em novembro, atingirá 65%, chegando em dezembro a 80%. “Como o carnaval é em fevereiro, acho que a gente consegue atingir esses indicadores”. No Brasil, a cobertura está mais lenta, da ordem de 46%. Mas, com a primeira dose, o percentual de brasileiros alcança 70%. “Contando que todos esses vão tomar a segunda dose no Brasil, você já tem hoje 70% vacinados. Já está bem perto. O que não pode é faltar vacina”. No estado do Rio, a vacinação está mais atrasada (em torno de 41%), porque há municípios que não vacinaram nem 10% da população ainda. Para Castro, é importante pressionar as autoridades para vacinar a população. “É fundamental”.

Ele lembrou ainda que os indicadores ajudam as autoridades a decidir o que pode e o que não pode ser liberado no carnaval. Se o passaporte vacinal for exigido, por exemplo, reduz o risco de pessoas não vacinadas irem para a cidade, além do risco de transmissão, adoecimento e morte durante o próprio carnaval, embora o impacto disso só seja percebido após o evento.

Outras medidas

O relatório indica outras medidas a serem tomadas pelas autoridades. Entre elas está a exigência do passaporte vacinal em espaços fechados, como no Sambódromo, clubes, bares e casas de festas, uma forma de proteção e direito coletivo em saúde pública. Além disso o levantamento sugere controle de fronteiras aéreas e terrestres, principalmente com a exigência da vacina, garantia de trabalho seguro nos barracões para os colaboradores, com a oferta de um projeto de segurança sanitária, onde possa ser oferecida a testagem para os trabalhadores, distribuição de máscara, distanciamento físico e higienização das mãos.

O documento sugere também a construção de mecanismos públicos, como um Painel do Carnaval, para o monitoramento dos indicadores ao longo de todo o processo, começando, no mínimo, 100 dias antes do carnaval, e terminando até 30 dias depois a festa. Um sistema de divulgação pública deverá ser montado para informar as agremiações e coletivos carnavalescos sobre a segurança sanitária e a viabilidade do carnaval, bem como calcular o impacto sobre a cidade após o evento.