O sonho de Jeff em deslanchar na carreira artística foi usado contra ele para que os suspeitos pudessem obter ganho fácil, segundo cruzamento de informações da polícia.
As investigações da Polícia Civil do Rio que embasaram o pedido de prisão de Bruno de Souza Rodrigues e Jeander Vinícius da Silva Braga afirmam que a morte do ator Jeff Machado foi cuidadosamente planejada para que os suspeitos obtivessem vantagens financeiras.
O sonho de Jeff em deslanchar na carreira artística foi usado contra ele para que a dupla pudesse obter ganho fácil, segundo os policiais. Sem parentes na cidade e vivendo em um lugar afastado, Jeff foi considerado uma “vítima perfeita”, de acordo com o cruzamento de dados da polícia.
Bruno está foragido. Já Jeander foi preso na manhã desta sexta-feira (2) e confessou envolvimento no crime, mas disse que foi Bruno quem dopou e matou Jeff.
O corpo do ator foi encontrado em um baú enterrado a 2 metros de profundidade e coberto de concreto em uma casa na Zona Oeste do Rio, no dia 24 de maio.
Os policiais da Delegacia de Descoberta de Paradeiros (DDPA) ouviram testemunhas, cruzaram informações de celulares e redes sociais e contaram com a ajuda de dados anônimos enviados ao Disque Denúncia.
Segundo os policiais, Jeff Machado e Bruno chegaram a manter um relacionamento, que se transformou em uma amizade. O pedido de prisão destaca que, com dificuldades financeiras, Bruno teria usado a ambição de Jeff de ter sucesso na carreira artística para tirar dinheiro dele.
“Em decorrência dessa proximidade, Bruno teve conhecimento de que o sonho do desaparecido era deslanchar na carreira artística, em especial, atuando como ator em novelas de emissoras de televisão. E, com base nessa informação, Bruno passa a colocar em prática um plano objetivando obter, de forma inescrupulosa e indevida, vantagens financeiras da vítima”, diz o pedido de prisão da Polícia Civil do RJ.
A Polícia Civil afirma que Jeff foi enganado com o pedido de pagamento para ter um papel garantido em uma novela. O fato de Bruno ter trabalhado em emissoras de TV ajudou a dar credibilidade à solicitação.
‘Vítima perfeita’, diz polícia
De acordo com as investigações da DDPA, Jeff Machado era a “vítima perfeita” para a aplicação de um golpe por não ter parentes próximos no Rio de Janeiro e ser uma pessoa com poucos contatos na cidade.
“Jeff era a vítima perfeita para quem desejasse obter vantagens econômicas em seu detrimento, uma vez que se tratava de um jovem que não possuía familiares no Município do Rio de Janeiro, que morava sozinho, em um imóvel situado em local ermo, não tendo um emprego fixo”, destaca o documento.
“Todos esses fatores favoreceriam consideravelmente que fosse criada uma história no sentido de que a vítima havia se mudado em busca de novos desafios profissionais, sem que isso pudesse, à primeira vista, ser vislumbrado como algo totalmente anormal.”.
Outro dado que chamou a atenção da Polícia Civil é o fato de Jefferson ter sido morto no dia 23 de janeiro, mas o desaparecimento ter sido registrado apenas no dia 4 de fevereiro. Bruno, inclusive, acompanhou o irmão de Jeff até a delegacia.
Bruno de Souza Rodrigues trabalhou na Globo até 2018, quando foi demitido pela empresa. Em nota, a TV Globo informou que forneceu à polícia os detalhes do desligamento.
Em depoimento, familiares de Jeff disseram que o ator afirmou que Bruno tinha conhecimento de uma pessoa que poderia empregá-lo. Extratos da conta bancária de Jeff mostraram que quatro depósitos foram feitos entre setembro do ano passado e janeiro deste ano, totalizando R$ 19.332. O pagamento foi feito com as economias da mãe de Jeff, que acreditava estar realizando o sonho do filho.
Como o ator passou a ser procurado pela família e por amigos após o desaparecimento, Bruno inventou que Jeff se mudou para São Paulo por causa de uma oferta de trabalho. Os investigadores afirmaram que, usando o aparelho da vítima, Bruno relatou datas contraditórias sobre a partida para a capital paulista.
Uma postagem chegou a ser feita nas redes sociais de Jeff, tendo como localização a cidade de Vila Prudente, em São Paulo. Porém, informações mostraram que o celular usado para a publicação nunca saiu do Rio de Janeiro.
Clima tenso
Segundo a polícia, o clima entre Jeff e Bruno passou a ficar mais tenso a partir do momento em que a data estipulada para o início das supostas “gravações” da novela se aproximava e nada acontecia.
“Assim, ao que tudo indica, com a proximidade do início da gravação da novela, onde Jefferson não estaria escalado em seu elenco, este passaria pressionar Bruno de Souza Rodrigues acerca do não cumprimento do prometido (compra da vaga no elenco da novela), exigindo a devolução da quantia ‘investida’, bem como uma possível desqualificação do indiciado que se apresentava como assistente de direção de grandes emissoras. Desse modo, a fim de garantir a impunidade de sua conduta criminosa, além do ganho patrimonial, Bruno decide matar Jefferson”, afirmou o pedido de prisão.
As investigações também mostraram que Bruno planejava ter mais vantagens financeiras após o crime com a venda da casa e do carro do ator. Aos policiais, Bruno afirmou que não levou o automóvel para avaliação e nem mostrou o imóvel para ninguém.
No entanto, os agentes descobriram que o carro foi levado para avaliação, e a venda só não foi concretizada porque Bruno dependia da assinatura de Jeff para a transferência do veículo.
“Soma-se a isso, existem relatos (denúncias anônimas direcionadas ao programa Disque Denúncia) no sentido de que uma pessoa estava anunciando, em sítios da internet, a venda do imóvel de propriedade de Jefferson”, cita a polícia.
Os policiais identificaram que a oferta foi feita a partir do celular que era usado por Bruno.
Crime premeditado
Para a polícia a morte de Jeff foi premeditada. Os investigadores afirmam que Bruno se passou pela vítima para alugar uma kitnet em Campo Grande, na Zona Oeste. O local foi usado para ocultar o corpo.
A conclusão de que Jeff foi morto no dia 23 de janeiro deste ano dentro da casa onde morava aconteceu a partir dos depoimentos dos suspeitos e de testemunhas, além de informações de telefonia dos envolvidos.
Após o crime, o corpo de Jeff foi colocado em um baú pelos dois homens e levado no porta-malas do carro até a kitnet que havia sido alugada por Bruno com o nome de Jeff.
Em vez do percurso mais rápido, Bruno e Jeander optaram por um trajeto mais longo para evitar possíveis abordagens policiais. Mesmo assim, eles encontraram um ponto de bloqueio e, com medo de serem parados com o corpo no porta-malas, ultrapassaram. O veículo acabou sendo multado.
Concretagem
No dia seguinte ao crime, Bruno fez sete ligações para lojas de material de construção. O celular de Jeff também foi usado em outras duas ligações com o mesmo fim.
“Bruno comprou materiais necessários à concretagem da superfície onde havia sido depositado o baú com o corpo da vítima. Jeander foi responsável pela escavação do local, acondicionamento do baú na cavidade aberta e pelo fechamento da cavidade”, afirmou o documento da Polícia Civil.
Um pedreiro foi contratado, então, para a concretagem do local.
Em depoimento, o profissional contou que foi chamado para levantar um muro e colocar um batente na porta, mas que não sabia que havia um corpo enterrado no local.
Cães
A investigação mostrou que os cartões de Jeff foram usados depois do crime para pagamentos e saques. Ainda no dia seguinte da morte, Bruno começou a dar um destino para os oito cães da raça Setter.
No dia 25 de janeiro, os cachorros foram levados, inicialmente, para um centro espírita de um conhecido de Jeander e depois soltos nas ruas.
Uma ONG de proteção animal recebeu a denúncia de que os cães estavam nas ruas e fez o resgate. Na clínica veterinária, verificou-se que eles possuíam um chip indicando que o tutor era Jeff. A identificação dos animais ajudou no trabalho dos policiais.
Dos oito animais, um nunca foi encontrado, dois morreram e cinco foram para novos lares com o consentimento da família de Jeff.
Marcelo
A defesa de Bruno afirma que existia mais um envolvido na cena da morte de Jeff: um homem chamado Marcelo. Ligado à milícia, ele teria participado da gravação de uma cena de sexo para uma plataforma de conteúdo adulto. E teria enterrado o corpo com Jeander, mas não teria matado o ator.
A polícia nega a existência de Marcelo e afirma que se trata de uma pessoa inventada para assumir a culpa dos dois no crime. Nesta sexta, a delegada responsável pelo caso voltou a negar que mais alguém estivesse na cena do assassinato.
“O Marcelo não existe. Está provado tecnicamente que não existe na investigação. O fato foi cometido somente pelo Bruno e pelo Jander Vinícius”, disse Elen Souto.
Os advogados de Bruno estiveram na Cidade da Polícia após o início da operação que determinou as prisões dos dois suspeitos, mas não falaram com a imprensa.