Vídeo mostra ataque racista a Seu Jorge em Porto Alegre

Clube onde ocorreu apresentação foi notificado para entregar registros de câmeras de segurança do espaço. Com as imagens, Polícia Civil quer identificar suspeitos do crime. Dirigente do clube deve ser intimado para prestar depoimento.

A Polícia Civil teve acesso a um vídeo que mostra o encerramento do show de Seu Jorge em Porto Alegre na última sexta-feira (14), momento em que teriam acontecido ataques racistas ao cantor.

A delegada Andrea Mattos, titular da Delegacia de Polícia de Combate à Intolerância e responsável por investigar o caso, conta que é possível ouvir, no vídeo, o momento em que alguém grita “macaco” e o instante em que pessoas começam a imitar o animal (veja aqui o vídeo).

Na segunda-feira (17), a Polícia Civil fez uma solicitação formal ao clube Grêmio Náutico União (GNU), onde ocorreu o show, para que entregue, em até três dias, as imagens de câmeras de segurança do espaço. O objetivo da delegada Andrea é identificar suspeitos do crime de racismo praticado no local.

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“Hoje [terça], irei intimar o dirigente do clube e pegar identificação dos organizadores”, afirma.

 

Ela espera que o dirigente seja ouvido até o final da semana. Além disso, existe a suspeita de que o clube tenha deletados postagens do show feitas em redes sociais.

Por meio de nota, o Grêmio Náutico União informou (veja íntegra abaixo) que está apurando internamente os fatos e que, se for comprovada a prática de ato racista, os envolvidos serão responsabilizados.

‘Muita grosseria racista’

Seu Jorge se manifestou pela primeira vez, na noite de segunda-feira (17), sobre os ataques racistas.

Seu Jorge se pronuncia sobre ofensas racista; assista aqui

Em vídeo de nove minutos divulgado nas redes sociais, o artista disse ter escutado vaias e xingamentos, além de ofensas racistas. A bandeira do Rio Grande do Sul é reproduzida em um telão no cenário.

“O que eu presenciei foi muito ódio gratuito e muita grosseria racista”, afirmou.

 

O cantor ainda afirmou que não viu pessoas negras entre as convidadas do evento, apenas entre funcionários do clube.

“Particularmente, não vi nenhuma pessoa negra no jantar. E as pessoas negras que eu encontrei foram somente os funcionários que, uma coisa que me causou muita espécie, eu ouvi dizer que eles estavam proibidos de olhar pra mim ou falar comigo quando eu chegasse no local do show”, falou.

 

Seu Jorge foi contratado para se apresentar no clube GNU na reinauguração do Salão União, que passou por reformas este ano.

O cantor agradeceu o apoio que recebeu de fãs porto-alegrenses e de outras partes do país. “Não era a cidade que eu reconheci, a cidade que eu comecei a amar e respeitar. Não era a cidade que eu conhecia”, afirmou. Ele também direcionou parte de sua fala à população negra do RS.

“Ao povo negro do Rio Grande do Sul e de toda a região do Sul, quero dizer que amo todos vocês, e admiro, respeito. E digo também que estamos mais unidos do que nunca e que vamos vencer essa guerra que segrega o nosso povo à miséria e à falta de oportunidade no Brasil”, sustentou.

No vídeo, Seu Jorge também ressalta ídolos e referências nascidos no estado, e defende políticas públicas de inclusão da população negra e de combate ao racismo.

Entenda o caso

 

Conforme relato do público presente, o crime teria ocorrido quando o cantor e a banda saíram do palco e retornariam para o bis.

“Começaram a gritar ‘mais um, mais um’, mas, logo em seguida, alguns sons de ‘uh, uh’. Primeiro, eu pensei que estavam vaiando. E já parecia estranho pra mim uma pessoa num show começar a vaiar. Depois, eu vi que eram movimentos de macaco. Cheguei a ouvir ‘negro vagabundo, vagabundo’ e, depois, pessoas gritando ‘mito, mito'”, disse uma pessoa que estava no evento e prefere não ser identificada.

O show transcorreu tranquilamente. A testemunha afirma que público era de cerca de 800 pessoas e estava animado.

“Ele não fez nada de diferente, já fui em alguns shows dele. Ele declamou uma música do Racionais MC, que chama ‘nego drama’, fazendo alusão à questão racial. Em um determinado momento, chamou um menino que toca cavaquinho, apresentou ele, disse que tinha 15 anos, falou que era um talento e, nesse momento, falou sobre a maioridade penal, quis dizer que a questão não é prender mais cedo ou mais tarde, e sim dar condições para esses jovens”, relatou.

Ela disse que o momento foi incrível e todos aplaudiram. Em seguida, teria havido o episódio de racismo. Com a manifestação, o cantor voltou ao palco apenas para agradecer e falou sobre amor.

“Ele disse ‘espero que vocês fiquem bem.’ Nesse momento, foi pior, as pessoas gritaram, vaiaram. Colocaram uma música e as pessoas se dispersaram. Mas vi muitas saindo indignadas de lá. Foi muito ruim, foi horrível”, contou a pessoa que estava no show.

Nota do Grêmio Náutico União:

 

O presidente do Grêmio Náutico União, Paulo José Kolberg Bing, irá conceder entrevista coletiva à imprensa às 14h. O Clube ressalta que está colaborando com as investigações relativas à possibilidade de ocorrência de racismo durante apresentação do cantor Seu Jorge, realizada em suas dependências em 14 de outubro.

É de total interesse do Grêmio Náutico União a transparente apuração dos fatos. Na eventualidade de comprovação de crime, defendemos a punição dos envolvidos na forma da lei.

Reafirmamos que o União, seguindo seu Estatuto e compromisso com associados e sociedade, repudia qualquer tipo de discriminação.

Fonte: G1