Junto com mudança em precatórios, medida liberaria até R$ 90 bilhões para programa social e outros gastos, como emendas parlamentares
BRASÍLIA — Integrantes da ala política do governo e membros do Congresso Nacional avaliam rever as regras de correção do teto de gastos como forma de abrir espaço no Orçamento de 2022 para pagar um Auxílio Brasil de pelo menos R$ 400, de acordo com fontes que participam diretamente das discussões.
Junto com a PEC dos Precatórios (despesas do governo decorrentes de decisões judiciais), a mudança pode liberar de R$ 80 bilhões a R$ 90 bilhões para o governo gastar em 2022, ano de eleições. Todas as mudanças podem ser feitas na PEC dos Precatórios, que pode ser votada numa comissão da Câmara ainda nesta semana.
Neste momento, a revisão é a possibilidade mais forte para solucionar a equação necessária para garantir o benefício no montante desejado pelo presidente Jair Bolsonaro, que provocou forte reação negativa do mercado financeiro por causa do risco de explosão dos gastos públicos acima da lei. O dólar disparou e a Bolsa de Valores despencou com o anúncio do Auxílio.
A mudança também faria a ala política do governo emplacar o discurso de que não furou o teto, apenas o alterou. A alteração liberaria pouco mais de R$ 30 bilhões para gastos dentro deste “novo teto”. A regra seria retroativa a 2016, ano em que o teto foi criado.
Os recursos a serem liberados poderão ser usados não só no Auxílio Brasil mas também em emendas parlamentares e quaisquer outros gastos.
Como a PEC dos precatórios liberaria mais R$ 50 bilhões para despesas, o espaço aberto no Orçamento no ano que vem seria de até R$ 90 bilhões.
Técnicos do Ministério da Economia, por outro lado, são contra essa solução de mudar o teto e dizem que ela é difícil de ser operacionalizada.
A alteração na regra é vista como uma saída por ministros como Ciro Nogueria (Casa Civil) e João Roma (Cidadania) e também está sendo avaliada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) .
O auxílio de R$ 400 com estouro do teto provocou forte reação negativa no mercado financeiro. A revisão na regra também pode ter um impacto negativo, já que muda as regras do teto.
O teto de gastos é a regra que impede o crescimento das despesas da União acima da inflação. A regra é considerada a principal âncora fiscal do país, por isso é defendida pelo mercado financeiro e pela equipe econômica.
Hoje, o teto de gastos é reajustado considerando o IPCA, índice oficial de inflação calculado pelo IBGE, para o período de doze meses encerrado em junho do exercício anterior ao Orçamento. Ou seja, para 2022, o valor do teto já foi calculado.
Por outro lado, as principais despesas do Orçamento (salários e aposentadorias) são calculadas pelo ano fechado (janeiro a dezembro). Há, portanto, um descasamento entre a forma como o teto e as despesas são corrigidas.
A ideia é unificar o momento de atualização e corrigir o teto no fim do ano, junto com as demais despesas. Ou seja, calcular a inflação entre janeiro e dezembro para o teto, assim como para o restante do Orçamento.
Sobrevida ao teto de gastos
O cálculo de técnicos da Consultoria de Orçamento da Câmara apontam que essa mudança liberaria R$ 30 bilhões no Orçamento de 2022. Essa conta foi apresentada ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que passou a discutir o assunto com deputados e integrantes do governo.
A conta é de que a mudança daria uma sobrevida ao teto de pelo menos dois anos.
A mudança seria colocada na PEC dos Precatórios, que pode ser votada nesta quinta-feira numa comissão da Câmara.
O Auxílio Brasil substituirá o Bolsa Família, programa que completou 18 anos nesta semana. Numa reunião no Palácio do Alvorada na segunda-feira, Bolsonaro determinou que o Auxílio Brasil seja de pelo menos R$ 400 por beneficiário (contra os R$ 189 que hoje em média recebe quem está no Bolsa Família).
Na reunião, o Ministério da Economia avisou que um auxílio neste montante fura o teto de gastos. A conta da pasta é de pelo menos R$ 30 bilhões seriam pagos fora do teto.
Integrantes da Câmara dos Deputados e da ala política do governo, encabeçada pelo ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, resgataram então uma proposta que circula nas rodas de Brasília há pelo menos um mês, que é de mudar a forma com o teto é calculado.
Teto será respeitado
Essa solução é defendida pela ala política do governo. Tanto que ministros como João Roma (Cidadania) afirmam que o teto será respeitado.
Técnicos que trabalham com Orçamento no Ministério da Economia são contra essa mudança porque avaliam que ela é de difícil execução.
Para isso, será preciso mudar a Constituição, já que pelas regras atuais o teto só pode ser revisto em 2026. A mudança seria colocada na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios, que muda a sistemática de pagamentos de despesas do governo decorrentes de decisões judiciais.
Seja qual for a solução, ela ficará na PEC dos Precatórios, que está encaminhada para ser votada ainda este mês na Câmara. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), prometeu votar a proposta na Casa em pelo menos dez dias depois da eventual aprovação na Câmara.
A solução defendida pelo Ministério da Economia é de um auxílio de R$ 300, dentro do teto, o que já foi descartado pelo governo. Para isso, porém, seria necessário aprovar a reforma do Imposto de Renda (IR) no Senado, onde há resistências à medida.
Fonte: O Globo