KIEV — No quinto dia da invasão russa à Ucrânia, as forças comandadas pelo presidente Vladimir Putin intensificaram seus ataques contra Kharkiv, segunda maior cidade do país, e nos arredores da cidade portuária de Mariupol, estratégica na região do Mar de Azov, contíguo ao Mar Negro. De acordo com serviços de monitoramento por satélite, tropas russas estão posicionadas a cerca de 30 quilômetros da capital ucraniana, Kiev, e surgem denúncias do uso em combate de armas de fragmentação, proibidas por um tratado internacional.
— Todos os dias o presidente me pergunta, todos os dias nós coordenamos os esforços sobre a situação e sobre o que está acontecendo, e todo dia nós respondemos que a situação é séria, mas estável — declarou à BBC o ministro do Interior ucraniano, Denys Monastyrskyy.
Em Kharkiv, cidade de 1,4 milhão de habitantes que tem uma considerável presença de ucranianos de origem russa, os ataques ocorreram também contra áreas civis, usando mísseis balísticos e teleguiados, e, segundo Monastyrskyy, deixaram “dezenas de mortos”. Vídeos publicados em redes sociais mostram prédios de apartamentos e veículos particulares destruídos, além de corpos espalhados pelas ruas — não foi possível confirmar a veracidade das imagens.
“Isso está acontecendo à luz do dia, quando as pessoas estão indo para a farmácia, fazer compras ou comprar água. É um crime”, disse em redes socias o governador da região, Oleh Sinegubov
Ao longo do final de semana, a cidade chegou a ser invadida pelas forças russas, que acabaram repelidas pelos militares ucranianos. Contudo, os bombardeios continuam — Kharkiv fica a 65 quilômetros da divisa com a Rússia.
Em Kiev, serviços de monitoramento por satélite mostraram que as forças russas estão a cerca de 30 quilômetros dos limites da cidade, e não dão sinas de que um avanço seja iminente. Contudo, a capital vem sendo alvo de ataques de mísseis, especialmente em seus arredores. Nas ruas, postos de controle e barreiras são cada vez mais frequentes.
Os combates também se intensificaram nos arredores de Mariupol, importante cidade portuária na costa do Mar de Azov: em meio a bombardeios, forças russas tentam assumir posições que permitam o cerco da área urbana, mas representantes do governo ucraniano afirmam que, apesar dos combates, não houve mudanças significativas no controle das áreas em disputa.
Segundo o chefe da Administração Marítima da Ucrânia, Vitaliy Kindrativ, todos os portos do país permanecerão fechados até que a invasão russa chegue ao fim. Em entrevista à Reuters, ele reconheceu que o porto de Mariupol sofreu danos consideráveis provocados pela artilharia russa. Outros terminais também sofreram danos, que ainda estão sendo avaliados.
Contudo, Kindrativ teme que uma nova fase do conflito, a possível invasão de tropas trazidas por navios russos, possa agravar a situação dos portos.
— Acho que o cálculo final [dos estragos] será feito após o fim da agressão russa, uma vez que existe a ameaça de tropas chegando ao país através dos portos, o que pode causar grande destruição à infraestrutura portuária — disse Kindrativ.
Companhias de transporte marítimo vêm evitando a região do Mar Negro, e toda navegação no Mar de Azov foi suspensa no dia 24 de fevereiro.
Hoje, há cerca de 100 embarcações estrangeiras “bloqueadas em portos ucranianos pela Marinha russa”.
— Elas só poderão navegar novamente depois que a Marinha russa remover seus navios de nossas águas soberanas, que as rotas sejam novamente seguras para a navegação, e depois que os capitães receberem o sinal verde das autoridades ucranianas para partir — afirmou.
Denúncia
Em meio aos combates, a Human Rights Watch e a Anistia Internacional acusaram a Rússia de usar bombas de fragmentação em alguns de seus ataques no país — esse tipo de armamento é proibido pela Convenção sobre Bombas de Fragmentação, assinada em 2008 e que teve a adesão de mais de 100 países, uma lista que não inclui Rússia, EUA e Brasil.
Bombas de fragmentação são um tipo de armamento que, quando lançado, libera uma série de explosivos menores, com o objetivo de causar o maior dano em uma área mais ampla. Além do impacto inicial do ataque, há o risco de algumas desses explosivos menores não serem detonados na hora, e serem posteriormente encontrados por civis nessas áreas, elevando o risco de vítimas, especialmente crianças.
Em comunicado, a Anistia aponta para um ataque contra uma creche na região de Sumy, que faz fronteira com a Rússia, no dia 25 de fevereiro. A ação, segundo a Anistia, deixou três mortos, incluindo uma criança.
“Não há possível justificativa para usar bombas de fragmentação em áreas povoadas, quanto mais perto de uma escola”, afirmou, em comunicado, Agnès Callamard, secretária-geral da Anistia Internacional. “Esse ataque traz todas as marcas do uso indiscriminado pela Rússia dessa arma banida internacionalmente, e mostra um flagrante resrespeito pela vida dos civis.”
A Anistia cita informações obtidas pela agência de checagem Bellingcat mostrando que destroços de armas usadas nessas áreas sao similares ao de foguetes usados em ataques com bombas de fragmentação.
Em outro ataque, agora denunciado pela Human Rights Watch, armas de fragmentação teriam sido usadas em um ataque perto de um hospital na região separatista de Donetsk, mas em uma área controlada pelo governo, no dia 24 de fevereiro, deixando quatro mortos e dez feridos. Imagens dos destroços dos armamentos também comprovariam se tratar de uma ação com bombas de fragmentação.
“Esse ataque violento matou e feriu civis, e causou estragos em um hospital”, afirmou, em comunicado, Steve Goose, diretor de assuntos sobre armamentos da Human Rights Watch. “As forças russas deveriam parar de usar bombas de fragmentação e pôr fim aos ataques ilegais com armas que matam e ferem de maneira indiscriminada.