Descarbonização do transporte requer diferentes tecnologias

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A descarbonização dos transportes é um tema vital e desafiador da agenda climática do Brasil. Relatório do Instituto Talanoa, entidade sem fins lucrativos, indica ser impossível o país cumprir a meta de reduzir a emissão de carbono em 480 milhões de toneladas até 2025. De acordo com cálculos da DNV, empresa global de certificação da área de energia, o setor de transporte responde por 25% destas emissões hoje.

Diante disso, a Leggio Consultoria, especializada em petróleo, gás e energia renovável, realizou um estudo sobre as alternativas para a substituição energética do diesel no Brasil nas próximas décadas. O trabalho considerou dados públicos e privados do setor, a regulação vigente e os investimentos já previstos tanto no segmento de combustíveis fósseis como no de renováveis. Através de metodologia própria e modelagens matemáticas desenvolvidas para o setor, a Leggio realizou projeções de oferta e demanda de diferentes fontes de energia.

A substituição energética do diesel deverá se dar em duas ondas distintas: na primeira, a transição terá como principal propósito a redução parcial das emissões de gases do efeito estufa (GEEs) associada a instrumentos de descarbonização do transporte. Na segunda onda, as novas motorizações terão como objetivo eliminar as emissões de GEEs. 

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“A divisão em duas ondas se deve ao fato de não haver tecnologia disponível, comercialmente madura e economicamente efetiva, que possa atingir a meta de emissão zero na próxima década. A introdução gradual de diferentes tipos de motorizações, de acordo com sua aplicação, permitirá o desenvolvimento da tecnologia adequando-se às exigências regulatórias vigentes. Mesma fórmula aplicada hoje para redução de emissões através dos padrões especificados pelo CONAMA no Programa de Controle de Emissões Veiculares 8 (atualmente Euro 6)”, afirma Marcus D´Elia, sócio da Leggio Consultoria.

As tecnologias disponíveis para substituir o diesel são: motorizações elétrica, híbrida diesel-elétrica, a gás natural (gás natural liquefeito ou gás natural comprimido) e a hidrogênio. Todos os tipos estão em fase de comercialização na Europa, exceto a motorização à hidrogênio. Os quatro principais segmentos de aplicação das motorizações são caminhões para entregas urbanas (tipicamente vans, caminhões leves e médios), ônibus urbanos, caminhões e ônibus para transporte em longa distância, máquinas e caminhões de uso agrícola.

“No momento, o diesel serve a todas as aplicações, mas no futuro as diferentes alternativas poderão cobrir segmentos distintos, onde deverão ser considerados cinco critérios na avaliação da motorização: autonomia, infraestrutura de abastecimento, valor inicial do investimento no veículo, custo de manutenção e mercado secundário (revenda)”, detalha o especialista.

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1ª Onda: redução de emissões

“Na primeira onda, que se consolida na década de 2030, a combinação entre o desenvolvimento de novos biocombustíveis, a motorização híbrida para veículos pesados e a neutralização de emissões através do mercado de carbono poderá ser a principal tendência para o transporte de carga e passageiros em longa distância. Este cenário é suportado no Brasil pelo estímulo aos biocombustíveis, a lenta articulação para a criação de corredores de abastecimento para combustíveis alternativos, somada à amplitude da malha rodoviária nacional e o atraso na criação do mercado de créditos de carbono. Assim, a substituição energética do diesel no Brasil deve vir através da adoção de veículos híbridos elétricos e a biocombustíveis”, explica D´Elia.

No mercado de ônibus urbanos, a expectativa é que o uso de veículos híbridos diesel-elétrico e veículos elétricos se fortaleça representando a principal tendência para este segmento nesta primeira onda. Em função do incentivo a estes dois tipos de motorização existente em algumas capitais e os custos promissores no ciclo de vida em relação a motorização à diesel, a velocidade de introdução desta tecnologia pode ser maior.

Nesta primeira onda, há a expectativa da ampliação do uso de caminhões elétricos leves nas frotas urbanas, principalmente em função da necessidade limitada de autonomia, que hoje é plenamente atendida pelos veículos disponíveis no Brasil. Considerando o custo no ciclo de vida, os caminhões elétricos se equivalem aos híbridos diesel-elétrico, e permitem substituição dos motores diesel atuais garantindo um patamar de emissão zero. Este segmento do mercado estaria se antecipando às exigências da 2ª onda.

Por último, máquinas e caminhões agrícolas podem utilizar veículos a gás, considerando o interesse em ampliação do uso de biometano em regiões onde sua produção ocuparia um espaço natural no manejo de resíduos agrícolas. A disponibilidade comercial de veículos com esta motorização no país facilita o teste e desenvolvimento deste segmento, de forma a preparar o setor agrícola para a transição energética. O consumo neste segmento representa atualmente cerca de 15% do volume de diesel B no país.

2ª Onda: zero emissões

Apenas na década de 2050 deverão ocorrer as condições que sustentem a mudança tecnológica para atingir o cenário de zero emissões, principal característica da 2ª onda. Um exemplo são as “carbon taxes” que seriam representativas o suficiente para justificar os custos adicionais necessários para impulsionar a tecnologia. “Neste caso, haveria duas soluções atualmente disponíveis: motorizações elétrica e a hidrogênio. Ambas não atenderiam às condições para transporte de carga e passageiros em longas distâncias hoje, mas o desenvolvimento nas próximas décadas poderá trazer novas possibilidades. Assim, é necessário aguardar os próximos anos para uma definição clara”, afirma o consultor da Leggio.

No setor agrícola, a eliminação de emissões deverá ser direcionada para as motorizações elétrica e a hidrogênio, considerando tecnologias para produção local destes combustíveis, a partir da biomassa disponível. O vínculo entre disponibilidade de insumo e produção do combustível vai direcionar a transição neste segmento. D´Elia pondera que, como o horizonte de 2040 e 2050 é ainda de difícil previsão, não se pode descartar novos avanços tecnológicos que venham a melhorar as motorizações em desenvolvimento ou criar alternativas ainda não mapeadas comercialmente.

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