Fernando Francischini teve o mandato cassado pelo TSE por divulgar fake news sobre eleições. Na semana passada, Nunes Marques havia ‘devolvido’ o cargo ao parlamentar.
A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta terça-feira (7) por, por três votos a dois, derrubar a decisão do ministro Nunes Marques que tinha devolvido o mandato ao deputado bolsonarista Fernando Francischini (União-PR).
Francischini teve o mandato cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no ano passado por divulgação de informações falsas sobre as eleições.
Na semana passada, em decisão individual, Nunes Marques, do STF, derrubou a decisão e devolveu o mandato ao deputado.
Agora, com a nova decisão da Segunda Turma, fica restabelecida a decisão original do TSE e a cassação de Francischini.
Os ministros Nunes Marques e André Mendonça votaram pela manutenção da decisão de Nunes Marques, ou seja, confirmar o mandato de Francischini.
Já os ministros Edson Fachin, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes discordaram do relator – e, com isso, formaram maioria para restaurar a cassação de Francischini.
No fim da tarde, Francischini publicou um vídeo em rede social comentando a decisão. “Nosso recurso extraordinário ainda não foi julgado no STF. Nossa batalha pelo mandato de 427 mil paranaenses não acabou, tornou-se uma causa muito maior: a luta pela liberdade de expressão de todo cidadão nas redes sociais. Não vão nos calar”, disse.
O presidente Jair Bolsonaro se insurgiu contra a decisão da Segunda Turma do STF. Em evento no Planalto, ele repetiu as “fake news” que levaram à cassação de Francischini e atacou ministros do tribunal.
Os votos na Segunda Turma
Relator, o ministro Nunes Marques reafirmou nesta terça os argumentos por ele apresentados na decisão individual. Para o ministro, o TSE equiparou equivocadamente, em julgamento ocorrido em 2021, a internet a meios de comunicação tradicionais para condenar o deputado nas eleições 2018.
“Ninguém poderia prever, naquela eleição, quais seriam as condutas que seriam vedadas na internet, porque não havia qualquer norma ou julgado a respeito”, disse.
“Não cabe, sob o pretexto de proteger o Estado Democrático de Direito, violar as regras do processo eleitoral, ferindo de morte princípios constitucionais como a segurança jurídica e a anualidade”, declarou Marques. “É de todo inconstitucional que nova baliza venha a ser aplicada retroativamente, mais de três anos depois de concluídas as eleições, em prejuízo de candidatos, legendas e terceiros.”
Em seguida, o ministro André Mendonça acompanhou o relator, afirmando que a live não teve o “condão” de alterar a vontade do eleitor.
“Entendo como também foi bastante consignado no voto [do relator] que um ato praticado a 22 minutos do encerramento do pleito eleitoral não teve o condão de alterar a lisura do pleito ou de influenciar de modo, não apenas não significativo, mas de modo também a não impactar aspectos circunstanciais do processo eleitoral. Não teve o condão de alterar a vontade do eleitor”, afirmou. “É adequado preservar a vontade desses eleitores e não aplicar uma pena tão forte que foi a perda de um mandato.”
Mendonça também defendeu que a Segunda Turma é o tribunal apropriado para julgar esse tema, e não o mandado de segurança que foi apresentado por um suplente e chegou a ser pautado no plenário virtual do STF. Ele pediu vista e adiou o julgamento pelo plenário.
O ministro Edson Fachin, terceiro a votar, divergiu do relator. Fachin, atual presidente do TSE, disse considerar que o tema deveria ter sido julgado pelo plenário do STF e discordou dos argumentos de Nunes Marques.
“A decisão proferida restabelece o mandato parlamentar com todas suas implicações para fins internos da Assembleia Legislativa. Peço toda vênia [licença] para entender que a decisão proferida pelo TSE está correta e adequada à ordem jurídica”, afirmou.
Fachin disse ainda que a decisão de Nunes tem como pressuposto que o “candidato estaria promovendo mais um discurso e não um ataque ao sistema eletrônico de votação, enfim, à própria democracia”. “Tal prática, viola o pressuposto básico da democracia”, argumentou.
“Não pode o candidato agir contra a democracia. Não há direito fundamental para propagação de discurso contrário à democracia. O silêncio desse STF diante de tal prática configuraria em grave omissão constitucional e em descumprimento de suas nobres atribuições.”
“Às vezes, é necessário repetir o óbvio: não existe direito fundamental em atacar a democracia a pretexto de se exercer qualquer liberdade, especialmente a liberdade de expressão. A lealdade à Constituição e ao regime democrático é devida a todos, sobretudo aos agentes politicos, que só podem agir respeitando-a. Não se deve confundir o livre debate público de ideias e a livre disputa eleitoral com a autorização pra disseminar desinformação, preconceitos e ataques à democracia”, declarou Fachin.
O ministro Ricardo Lewandowski também divergiu do relator. O ministro citou uma questão processual.
Segundo Lewandowski, a medida concedida por Nunes Marques deve ocorrer apenas em casos excepcionais, já que o Supremo tem negado conceder decisões de urgência após recursos terem sido negados pelo tribunal originário, no caso, o TSE. Portanto, para Lewandowski, Marques não poderia ter decidido.
Entenda o caso
O caso começou a ser analisado pela Segunda Turma depois que o ministro André Mendonça pediu vista (mais tempo para análise) de outro julgamento referente o caso, que já havia começado no plenário virtual do STF e envolveria todos os 11 ministros da Corte.
No plenário virtual, o pedido era de relatoria da ministra Cármen Lúcia. Ela chegou a votar no sentido de reverter a decisão de Nunes Marques e foi acompanhada por Edson Fachin e Alexandre de Moraes.
O pedido de vista, segundo Mendonça, foi necessário para “evitar eventuais decisões conflitantes no âmbito desta Suprema Corte, em benefício da ordem processual e do rigor procedimental”.
Nunes Marques também decidiu pautar a questão na Segunda Turma. Com o pedido de vista de Mendonça, restou à Segunda Turma analisar o caso.
Condenação do deputado
Francischini foi alvo de investigações após afirmar em redes sociais durante o primeiro turno das eleições de 2018 que as urnas eletrônicas tinham sido adulteradas para impedir a eleição do presidente Jair Bolsonaro. Ele não apresentou provas da acusação.
O caso chegou à Justiça Eleitoral após o Ministério Público Eleitoral acusar o deputado de ter disseminado desinformação. A defesa de Francischini alegou que o parlamentar estava protegido pela “imunidade material”, que impede a responsabilização de deputados e senadores por suas opiniões, palavras e votos.
O deputado foi absolvido pelo TRE do Paraná que entendeu que não ficou provado que a declaração chegou a influenciar no resultado da votação. O MP recorreu da decisão e o caso foi para o TSE.
Por 6 votos a 1, o Tribunal Superior Eleitoral decidiu cassar o mandato do parlamentar. Francischini, então, recorreu ao Supremo.
O recurso foi analisado por Nunes Marques que, ao justificar a decisão favorável ao deputado bolsonarista, apontou que a norma do TSE que prevê a punição de candidato que usa informações falsas em redes sociais para influenciar no resultado das eleições, foi definida após a eleição de 2018 e, por isso, não poderia retroagir para servir como base para a punição de Francischini.
Fonte: G1