Por 48 votos a dois — e uma ausência, Gabriel Monteiro teve o mandato de vereador do Rio cassado. A decisão sobre o futuro do ex-PM e youtuber foi tomada nesta quinta-feira na Câmara dos Vereadores do Rio. Terceiro parlamentar mais votado nas últimas eleições, ele acumulou polêmica ao longo dos anos, como produções forjadas de vídeos envolvendo pessoas que não sabiam que estavam sendo filmadas e denúncias de assédio e de estupro. Acompanhe em tempo real os bastidores da sessão.
Dos 51 vereadores, apenas o próprio Gabriel Monteiro e Chagas Bola (União Brasil) votaram contra a cassação. Carlos Bolsonaro (PL) se licenciou do mandato em 2 de agosto para cuidar das mídias sociais do pai, o presidente Jair Bolsonaro (PL), que é candidato à reeleição.
O PSOL deve acionar o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) esta sexta-feira pedindo a impugnação da candidatura de Gabriel Monteiro a deputado federal.
— Quem tem comportamento bárbaro e não civilizado tem que ser banido. O registro da candidatura a federal tem que ser questionada. É incoerência poder se candidatar. A garota que fez o registro mandou um áudio integral. E Gabriel tentou culpar a vítima. Mas quem tem que avaliar agora é a Justiça eleitoral — disse o relator do processo Chico Alencar (PSOL).
Para Alexandre Isquierdo, presidente do Conselho de Ética da Câmara do Rio, a decisão foi imparcial:
—A Câmara como instituição sai fortalecida. Não houve corporativismo. Fomos coesos e imparciais. O próprio resultado de 48 a 2 mostra isso. Questões ideológicas foram deixados de lado. Foram dois processos de cassação em dois anos. E a Casa trouxe hoje uma resposta para toda a sociedade. Cada vereador teve a chance de expressar seu voto com consciência e responsabilidade- disse Isquierdo, relembrando o processo de Jairinho, cassado em 2021.
A fama de Gabriel nas redes sociais o catapultou da Polícia Militar onde tinha uma longa folha corrida marcada pela indisciplina para a política. Ex-integrante do grupo de direita Movimento Brasil Livre (MBL) com o qual rompeu por causa dos exageros que cometia como you tuber, foi o terceiro vereador mais votado do Rio em 2020 pelo PSD, com 60.326 votos, ficando atrás apenas de Carlos Bolsonaro (Republicanos) com 71 mil votos e Tarcísio Motta (PSOL), com 86.243.
Como estava na PM há menos de dez anos, Gabriel Monteiro teve que pedir demissão da corporação para assumir o cargo. Em menos de quatro anos na corporação, Gabriel cometeu 16 transgressões disciplinares Por 14 delas, o soldado recebeu, no total, penalidades que somam 33 dias de detenção. Em outros dois casos, foi punido com repreensão. Por causa das transgressões, ele foi classificado como um PM com “mau comportamento”, a pior das cinco classificações do estatuto da corporação. Ele chegou a ser demitido da corporação, mas conseguiu a reintegração na Justiça.
O soldado chegou a ser punido duas vezes por fatos ocorridos no Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças (CFAP), quando ainda era aluno da PM e estava longe de ser famoso pelas polêmicas na internet. Em sua primeira punição, em agosto de 2016, foi acusado de ter descumprido a ordem de um oficial e cumpriu dois dias de detenção. Ainda segundo sua ficha disciplinar, em outras duas ocasiões — em março de 2018 e em janeiro de 2019 —, quando já era soldado, o youtuber foi flagrado portando a arma da PM sem que estivesse de serviço e sem autorização.
Punições por faltar ao serviço
Ele também foi punido oito vezes por ter faltado ao serviço. Na metade dos casos, tinha sido escalado para integrar cercos à Favela da Rocinha.
ntre as confusões que se envolveu uma delas aconteceu em 2019, quando ainda era PM e invadiu e foi expulso justamente da Câmara de Vereadores do Rio porque queria protestar contra um evento organizado por Tarcísio Motta (PSOL) em homenagem à China.
Em março de 2020, Monteiro, publicou um vídeo em que abordava o coronel Íbis Souza e fazia questionamentos a respeito da participação dele em um evento dentro do Complexo da Maré, na Zona Norte do Rio. Na produção, ele insinuava que o oficial teria envolvimento com os traficantes da Maré. Íbis esteve na comunidade para dar uma palestra. Devido ao episódio, o político foi condenado a indenizar o coronel em 40 salários mínimos por danos morais.Sob o pretexto de que na prerrogativa de fiscalizar as condições de funcionamento de instalações públicas, passou a entrar em hospitais, abrigos entre outros cercado por assessores com celulares, produzindo imagens para seus vídeos monetizados nas redes sociais. Bateu boca com médicos, enfermeiros e outro técnicos. Em um dos casos foi condenado a indenizar em R$ 20 mil ao acusar nas redes sociais um médico da UPA de Magalhães Bastos de ter deixado o plantão para fazer sexo com uma enfermeira nos alojamentos. O médico estava no horário de descanso.
Gabriel também invadiu um abrigo para criança e adolescente durante a noite. A vereadora Laura Carneiro, então secretária de Desenvolvimento Social que não queria liberar a entrada do youtuber no período noturno foi seguida quase um mês por um dos assessores de Gabriel, que queria flagrá-la em alguma situação desconfortável. No Conselho de Ética, um dos ex-integrantes da equipe, revelou que Gabriel mantinha uma estrutura apenas para tentar acumular provas contra inimigos políticos. E tinha entre as ambições, preparar um vídeo no qual algum colega da Câmara fosse flagrado em uma situação que indicasse que estaria recebendo propina.
Por causa de Gabriel Monteiro, o prefeito Eduardo Paes chegou a baixar regras restringindo o acesso de vereadores a repartições. Mas recuou por pressão de outros vereadores, inclusive da base aliada, já que uma das prerrogativas constitucionais do legislativo é fiscalizar o Executivo. Gabriel monetizava esses videos em órgãos públicos. Ex-assessores estimaram que ele faturaria pelo menos R$ 300 mil por mês com as produções. Ao Conselho de Ética, ele estimou que seria apenas a metade disso.
‘Galinha pintadinha’
No início do ano, o vereador se envolveu em mais uma confusão ao acusar um empresário de tentar suborná-lo para não fiscalizar as instalações da empresa que prestava serviços de reboque e de depósito de veículos para a prefeitura. Logo depois, uma reportagem do “Fantástico” exibiu o reportagem com depoimentos de ex-funcionários que o acusaram de manipulação de vídeos, inclusive com menores de idade, e de mulheres que acusaram o vereador de estupro e abuso sexual.
Dias depois, começaram a circular vídeos nas redes sociais em que Gabriel aparece fazendo sexo com diversas mulheres. Um deles com uma adolescente de 15 anos que frequentou a casa de Gabriel por dez meses e era recebida ao som da trilha do infantil ”A Galinha Pintadinha”. Gabriel afirma que acreditava que a garota tinha 18 anos, mas o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), considera crime filmar relações sexuais com menores.
Em meio às investigações do Conselho de Ética, a Câmara do Rio aprovou uma resolução que afetou os rendimentos extras de Gabriel. Ele não pode mais monetizar vídeos que estejam relacionados com sua atividade de parlamentar nem usar a estrutura da Câmara do Rio para isso.
Basicamente, as acusações que pesam contra Gabriel Gabriel incluem o fato de expor menores em situações sensíveis e as identificando nas redes sociais, em prática proibida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). A mesma tese se aplica a um outro vídeo em que Gabriel orienta uma criança de doze anos sobre como proceder para a família receber doações em dinheiro.
Outra questão é o fato do vereador ter filmado relações sexuais com uma adolescente de 15 anos, o que também é crime pelo ECA. Além disso, pesa contra o vereador a denúncia de agressões contra um morador de rua por parte de um segurança durante a produção de um vídeo na Lapa.
Atualmente, Gabriel está no PL. Mesmo se perder o mandato poderá concorrer a deputado federal por conta das atuais regras da legislação eleitoral. Este ano, ele lançou na política a irmã, Daniela Monteiro, que tentará uma cadeira na Alerj.