Pai e filha foram encontrados mortos sob os escombros; outras quatro pessoas foram resgatadas com vida. Causas do desabamento são desconhecidas.
Por Carlos Brito, Diego Haidar, Fernanda Rouvenat, Filipe Fernandes, Larissa Caetano e Rogério Coutinho, G1 e Bom Dia Rio
Um prédio de quatro andares localizado em Rio das Pedras, Zona Oeste do Rio de Janeiro, desabou na madrugada desta quinta-feira (3). Um homem e uma criança – pai e filha – morreram e quatro adultos foram resgatados com vida.
A morte do homem, identificado como Natan Gomes, foi confirmada pelo comandante do Corpo de Bombeiros, coronel Leandro Monteiro, por volta das 12h10, cerca de nove horas após o desabamento. Ele é o pai de uma criança de aproximadamente 3 anos de idade, cuja morte havia sido confirmada por volta das 10h20.
A mulher de Natan e mãe da criança, Kiara Abreu, havia sido a última pessoa resgatada com vida. Ela ficou cerca de seis horas sob os escombros e, lúcida, conversou com os bombeiros antes de ser retirada, informando que o marido e a filha também estariam no local.
Os três ficaram entre os escombros. O corpo da criança foi retirado do local por volta das 10h e o de Natan no início da tarde.
Outras três pessoas haviam sido resgatadas com vida na madrugada. Apenas uma delas ficou internada devido à gravidade dos ferimentos.
Segundo a prefeitura, 7 imóveis estão interditados, a princípio, no trecho da rua do desabamento – o que caiu e mais 6
Quem são as vítimas resgatadas com vida:
- Nataniela de Souza Gomes – 28 anos
- Antônia Tatiana Conrado de Souza – 38 anos
- Jonas Rodrigues de Souza – 29 anos
- Kiara Abreu, 27 anos
Desabamento ocorreu após estalos na estrutura
O prédio que desabou fica na Rua das Uvas, esquina com Avenida Areinhas. Ainda não se sabe quem construiu o imóvel e se ele era regular.
De acordo com testemunhas, por volta das 2h foram ouvidos estalos na estrutura do prédio. Às 3h20 ele ruiu e tombou para frente, derrubando a rede elétrica e atingindo imóveis vizinhos. Uma explosão ocorreu em seguida, dando início a um incêndio no local.
De acordo com a Prefeitura, oito famílias foram afetadas pelo desabamento e estão recebendo apoio do governo municipal.
“São oito núcleos familiares: três no predinho e mais cinco famílias nos prédios em frente, que foram afetadas diretamente pelo desabamento”, afirmou Laura Carneiro, secretária de Assistência Social da Prefeitura do Rio de Janeiro.
“Todas estão cadastradas, o Estado ofereceu aluguel social, muitas delas têm onde ficar. Eles estão recebendo colchonete, cestas básicas e alimentação. Nosso posto avançado ficará aberto 48h no salão de festa da comunidade em revezamento de servidores para atender as famílias.”
O que se sabe até agora:
- Prédio de 4 andares desabou por volta das 3h20;
- Testemunhas disseram que estalos da estrutura começaram por volta das 2h;
- Pai e filha morreram no desabamento;
- Quatro pessoas foram socorridas com vida e levadas ao hospital;
- Quarta pessoa a ser resgatada com vida passou 6h sob os escombros;
- Defesa Civil avalia danos em quatro imóveis vizinhos ao que desabou;
- 7 imóveis estão interditados
“Eu pensei que era o transformador que tinha estourado, mas não. Depois que todo mundo desceu chorando e gritando aí a gente veio pra rua e viu que o prédio desabou”, contou uma moradora da região que se identificou como Luciana.
Três vítimas foram resgatadas na madrugada. Uma quarta vítima foi retirada dos escombros por volta das 9h20, seis horas após o desabamento. Foi ela que, lúcida, informou aos bombeiros que havia um homem e uma criança também presos aos escombros – eram o marido e a filha dela.
Inicialmente, ainda na madrugada, o Corpo de Bombeiros havia falado em 12 pessoas resgatadas. A informação foi atualizada no começo da manhã pelo comandante da corporação, coronel Leandro Monteiro, que confirmou o resgate, até então, de apenas três vítimas na madrugada e que pelo menos outras três estariam sob escombros aguardando o resgate.
“O que posso afirmar é que estamos em contato direto com uma vítima feminina. O local é de difícil acesso, de risco para os bombeiros – eles estão trabalhando sob os escombros e equipados com equipamento de segurança individual. É um trabalho de muita calma, muita paciência, nossos cães estão nos ajudando bastante. Estamos lidando com informações diferentes a cada momento. Localizamos uma vítima feminina e ela afirma que há mais duas vítimas”, afirmou o comandante dos bombeiros.
Segundo o coronel, seis ambulâncias foram enviadas ao local e uma aeronave da corporação ficou de prontidão nas imediações. Ao todo, 112 bombeiros estão envolvidos nos trabalhos de busca e resgate.
“A maior dificuldade é conscientizar os moradores dos prédios vizinhos a deixarem suas casas e seguirem para um local seguro”, enfatizou.
A Defesa Civil foi ao local e os técnicos avaliavam os danos que foram causados em outros quatro imóveis, vizinhos ao que desabou – um ao lado direito e três em frente.
Equipes de três quartéis do Corpo de Bombeiros – Barra da Tijuca, Alto da Boa Vista e Jacarepaguá – trabalham no local à procura de vítimas. Equipes da Assistência Social, Defesa Civil e Guarda Municipal também foram deslocados para a região.
Região de imóveis irregulares
Ainda não se sabe quem construiu o prédio e se a obra é regular ou irregular. Todavia, a subprefeitura de Jacarepaguá Talita Galhardo disse que, possivelmente, a construção era irregular.
“Eu não vou afirmar isso agora, mas é muito provável que não estivesse [regular] mesmo. Porque todas as construções do entorno, inclusive as que estão correndo risco, tem muitas que não têm nenhum tipo de licença, não tem nada”, disse a subprefeita.
De acordo com a prefeitura, 75% dos imóveis irregulares demolidos na cidade entre 2019 e 2020 ficavam na Zona Oeste.
A região de Rio das Pedras é controlada pela milícia o que, segundo o Conselho Regional de Engenharia (Crea-RJ), dificulta a fiscalização.
Em 2019, um prédio que construído por milicianos desabou na Muzema, a cerca de 3 km do local, matando 21 pessoas.
A Secretaria de Estado de Polícia Civil (SEPOL) do Rio de Janeiro montou uma força-tarefa reunindo a 16ª DP (Barra da Tijuca), a 32ª DP (Taquara), a Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente (DPMA) e a Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas e Inquéritos Especiais (DRACO) para apurar as circunstâncias do desabamento. A polícia diz que segundo informações inicias, o imóvel que desabou era antigo e foi construído há mais de 20 anos por familiares que moravam no local e sua construção não teria ligação com a milícia.
‘Berço’ das milícias
Rio das Pedras é considerado o berço da milícia no país. A região habitada em sua maioria por retirantes nordestinos, ainda nos anos de 1960, se protegeu como pode dos avanços das facções de narcotraficantes que começaram a dominar territórios duas décadas mais tarde.
A região resistiu a guerras sangrentas e viu surgir a falsa proteção de grupos paramilitares que prometiam a tranquilidade que moradores não teriam em favelas onde drogas eram vendidas.
Um dos fundadores da milícia na região foi o inspetor de polícia Félix Tostes. Tostes foi morto em 2007 com mais de 30 tiros. Na época, quem assumiu o comando da miliciana região foi o vereador Josinaldo Francisco da Cruz, o Nadinho de Rio das Pedras, que foi acusado pelo morte de Félix. Nadinho foi assassinado dois anos depois.
Há 2 anos, 24 mortos em desabamento de prédios irregulares
Em abril de 2019, 24 pessoas morreram no desabamento de dois prédios na Muzema, bairro vizinho ao Rio das Pedras, que haviam sido construídos de forma irregular, supostamente por milicianos que atuam na região.
Três homens que haviam sido presos acusados como responsáveis pela tragédia foram soltos pelo Tribunal de Justiça no mês passado. A decisão foi assinada pela juíza Simone de Faria Ferraz, que considerou haver ‘excesso de prazo na custódia’ do trio e determinou que eles aguardem o julgamento em liberdade.
Os três réus são José Bezerra de Lira, Rafael Gomes da Costa e Renato Siqueira Ribeiro. A juíza determinou que eles informem, mensalmente, seus paradeiros à Justiça. Eles também não poderão ter contato com nenhuma das testemunhas do processo.
As investigações apontaram que os três têm envolvimento com milícias. José Bezerra de Lira, conhecido como Zé do Rolo, foi apontado pelos investigadores como o líder do grupo responsável por vender apartamentos nos prédios que caíram.
Zé do Rolo foi preso em setembro de 2019 após ser encontrado no Sertão de Pernambuco, em um sítio na região de Afogados da Ingazeira, no Alto Pajeú.
Fonte: G1