Considerado o grande salão internacional do queijo na França, o Mundial de Queijos e Produtos Lácteos de Tours deu ao Brasil 81 medalhas na edição deste ano, encerrada no último dia 12. Foram 17 medalhas de ouro, 23 de prata e 41 de bronze. Na edição anterior, realizada em 2021, o Brasil conquistou 57 medalhas. O concurso ocorre a cada dois anos em Tours, no Vale do Loire.
Ao todo, foram 1.640 queijos avaliados de vários países, dos quais 288 foram apresentados por 91 produtores brasileiros dos estados de Minas Gerais, Bahia, Pará, Ceará, Goiás, Paraná, Santa Catarina, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Rio de Janeiro, Santa Catarina e São Paulo. Das 17 medalhas de ouro, dez foram para produtores de Minas Gerais.
Dentre os queijos medalhistas ouro, o concurso selecionou ainda os 12 melhores do mundo na categoria Super Ouro. Destaque para o único produto não europeu, que ficou em sétimo lugar: o Caprinus do Lago, produzido por Fabrício Le Draper Vieira, no Capril do Lago, em Valença, município da região sul do estado do Rio de Janeiro. A França ficou com 10 dessas medalhas e a Suíça com uma.
Em entrevista à Agência Brasil, o produtor fluminense revelou que essa foi a primeira vez que ganhou ouro em um concurso mundial de queijo fora do país. Os produtos dele ganharam também uma medalha de bronze para o queijo de vaca com páprica na capa chamado Destino – nome do vilarejo onde seu pai nasceu.
Fila de espera
O Caprinus do Lago é um queijo de massa prensada, semicozida, feito com leite cru de cabra.
“Leva um ano para ficar pronto. E todos os dias, a gente tem que virar e escovar ele. São necessários 17 litros de leite para fazer um quilo de queijo. A produção desse queijo é feita duas vezes por semana, embora ele leve um ano para ficar pronto. A gente faz um queijo de cinco quilos”.
Vieira conta que a fila de espera para comprar o produto tem mais de mil pessoas e que o prazo de espera costuma chegar a um ano. “A gente não esperava tamanha repercussão”.
Mesmo com tanta procura, ele não pretende aumentar a produção, mas sim manter a qualidade do produto. “Quero que seja um produto exclusivo, do tipo prêmio, que a pessoa vai ter que esperar para poder provar”. Outro detalhe é que ele não vende o queijo inteiro de cinco quilos para uma pessoa só. “Eu prefiro mandar um pedaço para 20 pessoas do que um inteiro para uma pessoa só”.
Fabrício Le Draper Vieira tem feito degustação do queijo Super Ouro no bistrô que mantém no Capril. “Se a pessoa for lá almoçar ou jantar com a gente, eu permito uma degustação do queijo. Mas só lá. É uma forma também de monetizar um pouco e viabilizar o projeto que ainda não é autossustentável. É um projeto de investimento, porque eu faço queijo da pandemia (da covid-19) para cá. Tem pouco tempo. Eu vivo da odontologia. Sou dentista”.
Paixão
Nascido em uma família com 38 dentistas, Fabrício tem uma carreira sólida na odontologia. No ano passado, ele foi incluído entre os 100 melhores dentistas em uma lista promovida por uma associação internacional da categoria. Para ele, o segredo de seu sucesso tanto na produção de queijos quanto na odontologia é a paixão. Para ele, tudo que é feito com paixão prospera.
“Agora, coloquei tanta paixão no queijo que, em pouco tempo, consegui botar o queijo também entre os melhores do mundo. Acho que a paixão é o grande diferencial de tudo que eu faço. Faço tudo com muito amor, com muita paixão e tem dado certo”.
O gosto pelos queijos e pelas cabras surgiu ainda na infância, quando tinha 12 anos. Pediu ao pai uma vaca, mas viu que não conseguiria tirar leite do animal tão alto. Então, em uma exposição agropecuária, conheceu e se encantou com uma cabra leiteira. “Foi paixão à primeira vista. Eram lindas [as cabras] e de um tamanho que eu podia lidar”.
Melhor queijista
Outro destaque em Tours foi a brasileira Marina Cavechia, empreendedora e dona de um bar especializado em queijos na capital federal. Após ser eleita melhor queijista do país em 2022, ela foi selecionada para representar o país e concorrer na etapa mundial da competição. O título de melhor queijista do mundo, no entanto, ficou para o francês Vincent Philippe.
Apesar do resultado, Marina disse à Agência Brasil que a experiência foi muito rica. Ela competiu com outras 15 pessoas do mundo inteiro e se preparou durante seis meses no Brasil e um mês antes do concurso, na França, onde trabalhou com pessoas que ganharam a competição há alguns anos.
“Foi a coisa mais difícil que eu já fiz até hoje. Foram as nove horas mais difíceis da minha vida em termos de trabalho. Mais difícil que o primeiro emprego, mais difícil que o vestibular”.
Para Marina, a disputa não é vencida somente pela técnica e, assim como Fabrício Vieira, ela conta que a paixão pela atividade tem grande peso. “De alguma forma, eles vão pesando isso, a paixão e o respeito por esse universo e pelo produto”.
Essa foi a primeira vez que o Brasil participou do concurso de melhor queijista do mundo, em Tours. “Eu não podia fazer feio. Tinha que fazer bonito e representar o país”. Pelo fato ainda de ser mulher, a experiência foi duplamente importante para ela. “Foi um processo de aprendizado muito grande”.
Marina voltou da França sem o troféu, mas com muita experiência na bagagem. Para ela, competições como essa demonstram a importância de se valorizar o setor queijeiro no país.
“É inegável que traz uma consciência para o consumidor, para o governo, para o nosso país de que a gente está cada vez mais se especializando e querendo oferecer um serviço que não é qualquer pessoa que pode oferecer. Tem que estudar”, finaliza Marina, que já retomou aulas de francês e está decidida a concorrer novamente no mundial de 2025.