Diante dos ataques recentes, em que policiais atiraram contra colegas nos estados do Ceará e de São Paulo, o ouvidor da Polícia do Estado de São Paulo, Cláudio Aparecido Silva, avalia que os casos de violência evidenciam um adoecimento das tropas policiais.
“Nós estamos convivendo com altos índices de suicídio, tentativas de suicídio e violações de policiais contra policiais, então a gente percebe um adoecimento muito forte dessa tropa e a gente precisa enfrentar esse adoecimento e garantir proteção para esses policiais, humanização e observância dos seus direitos humanos”, disse o ouvidor.
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Na manhã de ontem (15), um sargento da Polícia Militar (PM) matou dois policiais militares por disparos de arma de fogo, nas dependências da 3ª Companhia do 50º Batalhão de Polícia Militar do Interior (50º BPM/I0), em Salto, no interior paulista. Na madrugada do domingo (14), quatro policiais civis foram assassinados a tiros na Delegacia Regional de Camocim, cidade do interior cearense. Eles foram surpreendidos por um colega que estava de folga e chegou ao local já atirando.
O presidente do conselho do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), Cassio Thyone Rosa, pondera a dificuldade de identificar as causas de eventos violentos entre os policiais, mas também aponta para o adoecimento dos profissionais.
“Os motivos em si ainda não foram explicitados. Ele, o provável autor, sequer deu uma declaração a respeito disso [chacina no Ceará]. Isso vai ser objeto de investigação, mas o que a gente pode supor em relação a esse tipo de caso é que obviamente existe um problema grave relacionado à saúde mental desse profissional”, disse.
Prevenção
Em relação às políticas preventivas de situações como essas no estado de São Paulo, o ouvidor da polícia sugere que a Secretaria de Segurança Pública (SSP), o governo do estado e os comandos das polícias, junto com a Ouvidoria, realizem uma força-tarefa para um estudo aprofundado que ouça a base dos trabalhadores, as corporações e especialistas, com o objetivo de enfrentamento do problema.
“A gente precisa fazer um diagnóstico aprofundado dessas condições, o que tem ocasionado esses rompantes que provocam suicídio, morte entre policiais, entre outras formas de adoecimento dessa tropa, para que a gente consiga efetivamente estudar caminhos para cuidar desse tipo de adoecimento que tá acontecendo”, disse. Além disso, ele aponta que há outras políticas que precisam ser consideradas, como valorização profissional, plano e reestruturação de carreira.
Rosa aponta que existem iniciativas que podem ser aplicadas em relação à prevenção de surtos, de doenças mentais e de adoecimento da tropa. “O que é necessário é que essas instituições tenham um acompanhamento psicológico regular para poderem detectar quando um profissional realmente está precisando de ajuda.”
Para ele, é preciso que as corporações disponibilizem o tempo todo essa ajuda e que promovam ações que tragam para a tropa a consciência de que é importante cuidar da saúde mental dos policiais.
Suicídio
Em pouco mais de um ano, entre janeiro de 2020 e abril de 2021, foram aprovadas 1.647 licenças por transtorno mental para policiais militares do estado. O dado foi obtido via Lei de Acesso à Informação pela agência de dados Fiquem Sabendo.
Em 2021, em todo o país, 101 policiais entre militares e civis, na ativa, cometeram suicídio, sendo 24 deles no estado de São Paulo. A informação está no 16º Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Em 2020, foram 65 suicídios, o que representou aumento de 55% nesse tipo de ocorrência de um ano para o outro.
No início do mês, a Ouvidoria da Polícia de São Paulo divulgou nota após uma policial militar cometer suicídio. “Ao mesmo tempo em que externa seu pesar, esta Ouvidoria manifesta sua preocupação com os altos índices de suicídio ocorridos no decorrer do ano de 2023, informando que intensificará suas diligências junto à Secretaria de Segurança Pública do Estado e demais autoridades estaduais e federais para acompanhar e conter os tristes índices de adoecimento mental de nossas corporações.”
Rosa explicou que o suicídio “é um ato extremo, no qual aquele que opta por atentar contra a sua vida está tomando uma decisão radical para interromper um sofrer, um sofrimento psicológico”. Para ele, a solução para esse assunto também passa por prevenção, informação e atendimento psicológico a serem oferecidos aos policiais, e que as instituições estejam preocupadas com a saúde mental de seus profissionais.
“É preciso lembrar que o policial, além do estresse que todos nós estamos sujeitos por condições particulares, ele vai enfrentar também um estresse que é relacionado ao exercício da sua função”, alertou.