‘Vou ser cassado em tempo recorde’, diz Arthur do Val sobre processo no Conselho de Ética da Alesp

Em vídeo divulgado nas redes sociais, deputado afirma que perderá o mandato “em três dias”. Prazo apontado pelo parlamentar, porém, é irreal, uma vez que regimento prevê tramitação de um mês do pedido de cassação, com tempo para duas defesas.


O deputado estadual Arthur do Val (Podemos) disse nesta terça-feira (8), em vídeo divulgado em suas redes sociais, acreditar que perderá o mandato de deputado estadual no que considera “tempo recorde”, após o vazamento de áudios com frases machistas e sexistas sobre mulheres ucranianas.

“Vou ser cassado em três dias. Vai ser o recorde de tempo (…) Vou ser cassado em três dias porque meu áudio vazou”, afirma.

O tempo, porém, não condiz com a realidade. Pelo regimento da Casa, processos de pedidos de cassação tramitam por 30 dias no Conselho de Ética, com prazos para duas defesas e, uma vez aprovada a penalidade máxima, decisão ainda precisa passar por votação no plenário.

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Na gravação, ele também considera que tal punição não seja justa. “É proporcional a punição que eu estou tendo? É justo, eu mereço ser cassado? Eu acho que não.”

Durante os cerca de 12 minutos da gravação, ele confirma também confira e justifica o que já havia revelado em entrevista exclusiva ao g1, que irá se afastar do Movimento Brasil Livre (MBL).

Conselho de Ética

Mais cedo, em entrevista à GloboNews, a presidente do Conselho de Ética da Assembleia Legislativa de São Paulo, Maria Lúcia Amary (PSDB), disse que mais 30 deputados assinaram representações contra as declarações sexistas do deputado Arthur do Val (Podemos), todas pedindo a cassação do mandato, e que a comissão dará a resposta que a sociedade espera.

“Nós temos que analisar os fatos. Na realidade, o que que acontece, eu tenho percebido nesse mandato, eu estou no 5º mandato, a incontinência verbal, discursos de ódio e todas essas ações têm que ser contidas, porque a nossa assembleia de São Paulo é a maior assembleia da América Latina, portanto, ela não pode passar dos seus limites sem a punição adequada. A sociedade está esperando uma resposta e a Comissão do Conselho de Ética e do Decoro Parlamentar vai dar essa resposta para sociedade, sim“, afirmou em entrevista à GloboNews.

Durante a entrevista, ela destacou que, como mulher, “ficou chocada”, com as declarações do deputado e com a gravidade do caso.

“Como mulher e deputada, porque eu não posso comprometer a minha imparcialidade, eu repudio essa fala. Além dela ter sido sexista, ela também foi discriminatória quanto a classe social, no momento em que ele fala que as mulheres pobres são mulheres fáceis. Como mulher, eu fiquei bastante chocada”.

“Então, nesse caso, eu entendo que foi extremamente grave, constrangeu a todos nós, deputados e deputadas, e o que eu acho de relevante, que não só de extrema-direita, de extrema-esquerda, mas todos os deputados e deputadas se manifestaram e estão fazendo questão, já temos mais de 1/3 de deputados e deputadas que assinaram essas representações.”

Representações

Segundo a presidente do Conselho, doze representações foram protocoladas contra o deputado desde sexta-feira (4), a maioria pedindo a perda do mandato.

Do total, nove são individuais, ou seja, elaboradas por um único deputado, e três são subscritas por grupos de deputados.

Ainda de acordo com a deputada, o grupo deve votar na manhã de quarta-feira (9) a unificação das doze representações.

“O próximo passo: teremos uma audiência amanhã, quarta-feira, para fazer o apensamento de todas as representações, juntando em um processo só, porque o objeto é o mesmo e o representado em todos é o deputado Arthur do Val, e em todas é pedido a cassação do mandato do deputado.”

As representações devem tramitar no Conselho por até 30 dias.

Em áudios que circularam pelas redes sociais na última sexta (4) , Arthur do Val dá declarações machistas e misóginas. Em uma delas, afirma que as mulheres ucranianas são “fáceis, porque são pobres”.

As mensagens foram enviadas para integrantes do Movimento Brasil Livre (MBL).

As representações foram protocoladas pelos seguintes deputados:

  • Emídio de Souza (de advertência até cassação)
  • Profª Bebel (de advertência até cassação)
  • Isa Penna (cassação)
  • Sgto Neri (cassação)
  • Luiz Fernando (cassação)
  • Gil Diniz (cassação)
  • Major Mecca (cassação)
  • Altair Morais (cassação)
  • Coletivo – 26 deputados (cassação) – Carlos Gianazzi (PSOL); Dr. Jorge do Carmo (PT); Emídio de Souza (PT); Gil Diniz (PL); José Américo (PT); Leci Brandão (PC do B); Luiz Fernando T. Ferreira (PT); Márcia Lia (PT); Maurici (PT); Mônica da Mandata Ativista (PSOL); Patrícia Bezerra (PSDB); Paulo Fiorilo (PT); Professora Bebel (PT); Ricardo Madalena (PL), Teonílio Barba (PT), Ataide Teruel (Podemos), Carlos Cezar (PSB), ,Castello Branco (PSL), Coronel Telha (PP), Coronel Nishikawa (PSL), Daniel Soares (DEM), Isa Penna (PSOL), Major Mecca (PSL), Valéria Bolsonaro (PRTB), Douglas Garcia (Republicanos), Tenete Coimbra (PSL)
  • Janaína Paschoal (cassação)
  • Valéria Bolsonaro (cassação)
  • PSDB (coletivo) – não temos informação sobre a punição sugerida

Tramitação na Alesp

Pelo regimento da Alesp, o Conselho recebe a representação, e a envia para a Secretaria Geral Parlamentar, órgão responsável por instaurar o inquérito, notificar os membros do Conselho e o parlamentar representado.

Após a abertura do processo, o deputado terá o prazo de cinco sessões do plenário, o equivalente a cinco dias, para apresentar a primeira defesa.

Na sequência, é marcada uma reunião do Conselho para que os membros decidam se aceitam ou não representação.

Uma vez aceita, o deputado terá novamente o prazo de cinco sessões do plenário para se defender.

Após esse período, o relator apresenta seu voto e os membros do Conselho decidem sobre as penalidades, que podem ser: advertência, censura verbal ou escrita, perda temporária do mandato ou perda de mandato.

A perda de mandato, seja temporária ou permanente, precisa ser aprovada pela Mesa Diretora da Casa.

Após a decisão do Conselho, ela segue para votação em plenário, que precisa de maioria simples para ser aprovada.

Pré-candidatura

Arthur do Val confirmou a autoria de áudios. Após o vazamento das mensagens, o deputado pediu desculpas, disse que o que falou foi um erro e abandonou a pré-candidatura ao governo do estado de São Paulo neste sábado (5).

As falas foram alvo de críticas de políticos e personalidades.

Arthur do Val desembarca em SP após viagem à Ucrânia — Foto: Reprodução

Na representação, os deputados dizem que a fala de Arthur do Val, “além de inoportuna e incompatível com o decoro parlamentar, foi ultrajante não só para as mulheres ucranianas, que tiveram suas vidas destruídas por um conflito que não deram causa, mas acabou por ferir todas as mulheres do mundo, pois dignidade e respeito são conceitos universais”.

Eles argumentam que os áudios podem caracterizar atos de quebra de decoro parlamentar por afronta aos princípios constitucionais e regimentais.

Além da carta, uma nota oficial do PDT também pediu punições ao deputado Arthur do Val. No texto, o diretório municipal do partido defendeu a cassação do mandato do parlamentar.

“É nesse sentido que o Diretório Municipal do PDT São Paulo, junto com a Ação da Mulher Trabalhista do PDT da Capital de São Paulo defendem a cassação do mandato parlamentar, na certeza do apoio do Deputado Marcio Nakashima, mandato referência na defesa das mulheres contra a violência”, disse a nota.

O que dizem os áudios?

Nos áudios, que circulam nas redes sociais desde a noite desta sexta (4) e teriam sido enviados para integrantes do MBL, há declarações machistas e misóginas.

“São fáceis, porque elas são pobres. E aqui minha carta do Instagram, cheia de inscritos, funciona demais. Não peguei ninguém, mas eu colei em duas ‘minas’, em dois grupos de ‘mina’. É inacreditável a facilidade. Essas ‘minas’ em São Paulo você dá bom dia e ela ia cuspir na sua cara e aqui são super simpáticas”, diz o áudio

As declarações teriam sido feitas durante viagem à Ucrânia. Ele disse ter viajado para enviar doações para refugiados ucranianos após a invasão da Rússia ao país.

Nos áudios, o deputado estadual também teria comparado a fila de refugiadas à fila de uma balada.

“Acabei de cruzar a fronteira a pé aqui, da Ucrânia com a Eslováquia. Eu juro, nunca na minha vida vi nada parecido em termos de ‘mina’ bonita. A fila das refugiadas, irmão. Imagina uma fila de sei lá, de 200 metros ou mais, só deusa. Sem noção, inacreditável, é um bagulho fora de série. Se pegar a fila da melhor balada do Brasil, na melhor época do ano, não chega aos pés da fila de refugiados aqui.”

Em outro trecho, o áudio diz: “Passei agora quatro barreiras alfandegárias, duas casinhas pra cada país. Eu contei, são doze policiais deusas. Que você casa e faz tudo que ela quiser. Eu estou mal cara, não tenho nem palavras para expressar. Quatro dessas eram ‘minas’ que você se ela cagar você limpa o c* dela com a língua. Assim que essa guerra passar eu vou voltar para cá”.

O que o deputado disse sobre os áudios?

Ao desembarcar no Aeroporto Internacional de Cumbica, em Guarulhos, na Grande São Paulo, na manhã deste sábado (5), o deputado estadual confirmou que são seus os áudios.

Inicialmente, ele disse que “houve um mal entendido” e que as “pessoas estão misturando os áudios com outro contexto”.

“Foi errado o que eu falei, não é isso que eu penso. O que eu falei foi um erro, em um momento de empolgação“, disse ele.

Depois, o deputado gravou um vídeo no qual declarou que suas frases foram “machistas” e “escrotas” e afirmou que se comportou “como um moleque” ao responder a perguntas de amigos em um grupo de conversas entre parceiros do futebol.

“Eu só quero que as pessoas me julguem pelo que eu fiz, não pelo que eu não fiz”, disse o deputado.

Segundo Arthur do Val, os áudios não foram enviados a grupos “de política” e ele já estava na Eslováquia, quando teve acesso a internet, ao enviá-los.

Fonte: G1